20080531

20080529

O despertar de uma vocação

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Minha vontade era montar um set só de trash 90s, composto por músicas infalíveis como “All That She Wants”, do Ace of Base, ou “I’m Too Sexy”, do Right Said Fred. Mas, como não pretendo passar (muita) vergonha diante de tão radiosa companhia nas pick-ups, vou tentar não apelar para truques sujos, salvo um ou outro one-hit wonder. Tirando a implicância com o erro no final do meu sobrenome,
não tenho dogmas: se não funcionar, saco um Will Smith da algibeira e corro para os quadris do povo. O que importa é promover uma discotecagem de resultados.

Não é a primeira vez que me confundem com um DJ, conforme relatado abaixo.

***

(coluna publicada no jornal Correio Popular, de Campinas/SP, em 30 de outubro de 2001)

Porque Plutão estava com a lua em Peixes, Aquário, Capricórnio & Jones Ltd., o horóscopo recomendava: ouça a intuição, que dela emanarão as luzes que você procura para nortear sua carreira. Assim, com o firmamento conspirando em prol de minha inexorável ascensão profissional, preparei-me para mais uma edição do Free Jazz. Não imaginava de que forma um festival cuja atração mais esperada era o grupo escocês Belle & Sebastian poderia contribuir para eliminar o ócio nas tardes do colunista, mas o zodíaco não costuma falhar. Contatos? Lembranças? Revelações? Os astros elucidariam a questão.

Então, vesti minha melhor pose e cunhei criativos trocadilhos para que, quando a resposta chegasse, encontrasse em mim um veículo apto a desfrutar da sabedoria em sua plenitude. Deixei em casa qualquer preconceito acerca da já citada banda. Tentei escutar seus discos, para não ser ludibriado pelo set list distribuído à imprensa, invariavelmente com os nomes das músicas errados e fora de ordem. Ignorei os lugares comuns da mídia, que martelavam tristeza, depressão e baixa-estima. Esqueci a diferença de gerações, desculpa preferida para não considerar tudo frouxo, mal-tocado e desafinado.

Enfim, um turista estrangeiro que, por acidente, caísse no palco principal na sexta à noite e me visse, teria a absoluta convicção de que se encontrava diante de um legítimo indie – apesar da barriga saliente e dos vincos que querem transformar a face em um mapa da bacia hidrográfica amazônica. Porém, bastou a “dupla francesa” (não me canso de reproduzir essa mancada de um jornalão brasileiro) entrar no palco para que o condicionamento caísse por terra. De repente, a alegria com que o Belle & Sebastian fulminava os clichês a seu respeito passou para o segundo plano.

Olhei em volta. Identifiquei jovens poliglotas ou no último ano da Cultura Inglesa, a maioria universitários e bem-nascidos, em muito parecidos com os artistas que reverenciavam. Um exame mais apurado, à base de enquetes instantâneas, detectou uma imensa legião de wannabes, uma gente que quer ser algo ligado à comunicação, música, moda ou design. Acessam a internet, carregam razoável bagagem no cérebro, não fumam nem tomam café e tiraram o título de eleitor com 16 anos. E, no entanto, nada fazem. Vão vivendo um dia após o outro, aguardando a próxima festa do London Burning e expondo suas idiossincrasias em listas de discussão por e-mail.

Ainda pensava em como batizar essa nova tendência sem usar palavras inadequadas para não macular seu poder consumidor até ficar ciente de que essa tribo já existe e já foi rotulada. Na França, eles são milhares e receberam a pecha de “intelectuais precários”: pessoas altamente qualificadas, que dispõem da mais avançada tecnologia possível, mas que não têm “nenhuma perspectiva estável de emprego e renda”, como dizia o jornal. Daí para a associação com o que dizia o horóscopo foi um pulo, embora não ficasse esclarecido de que jeito a descoberta iria alavancar minha carreira.

Entretanto, a ansiedade por desvendar as mensagens cifradas dos astros me pregou uma peça. A verdadeira solução do enigma proposto pelo zodíaco só aconteceu no domingo, nos estertores do Free Jazz. Em frente ao palco Club, eu e o jornalista Pedro Só falávamos (!) para a TVE de Minas Gerais (quem surpreendeu, quem decepcionou etc e tal). Finalizada a entrevista, uma fotógrafa se aproximou de mim, pediu licença e perguntou: “Você é DJ, não é?”. Meu cinismo foi inútil. Quando vi, ela estava disparando o flash em minha direção, pedindo para eu sentar no degrau e fazer uma “cara de descontraído”. Ao seu lado, mais dois fotógrafos aguardavam pacientemente a vez para me clicar.

Comentários gratuitos sobre músicas idem

Curumim, Japan Pop Show
Curumim está para setores da imprensa estrangeira como o jogador Alex está para os turcos. Do mesmo modo que os torcedores do Fenerbahce querem porque querem ver o meio-campista envergando a camisa 10 do escrete canarinho, um certo underground norte-americano não entende como o japa paulistano não está na linha de frente da música brasileira. Ei, mas ele está na linha de frente! É que aqui a coisa rola num certo underground também. Donde se conclui que o busílis não é ser ou não ser reconhecido. O problema é o underground. (A resenha de verdade saiu aqui.)

20080524

20080521

Comentários gratuitos sobre músicas idem

The Presets, Apocalypso
Algo está acontecendo na Austrália. De 2005 para cá, sempre tem alguma banda nova daquele país disposta a conquistar o resto do planeta com música que parte da eletrônica para avançar sobre outros estilos, como os grupos Midnight Juggernauts ou Cut Copy. Com o disco Apocalypso, a dupla The Presets firma-se como o mais promissor desses nomes e deixa claro que não deve demorar muito para que as pistas de dança sejam regidas novamente por aussies.
(continua)


Bem-aventurados os cordiais; eles terão prioridade na fila do Paraíso

Uma Mega-Sena já resolveria a vida de muita gente. Mas só tem fila para jogar quando está acumulada. Devem ser as pessoas que não têm o hábito de acreditar toda semana. Afinal, a probabilidade de ganhar com uma aposta simples é de uma para 50.063.860, maior apenas do que a chance de isso acontecer duas vezes. Então, se é para queimar o único cartucho da sorte desta encarnação, que seja por muito.

Pois é, sou um desses babacas.

E do pior tipo: o que não deixa para o último dia para evitar fila – e pega fila do mesmo jeito, porque a mediocridade evolui por ressonância mórfica. Tudo faz parte de um ritual que, no universo racional, é considerado critério. Jogar somente quando o prêmio ultrapassa R$ 20 milhões. Um cartão com seis dezenas e nada mais. E nunca tentar estabelecer alguma lógica para escolher os números.

Assim sendo, na terça-feira me preparei para desafiar o Acaso. Tinha de ser em algum lugar que comovesse a Fortuna a ponto de ela baixar por ali. A lotérica do terminal central pareceu ideal. Sua freguesia é formada majoritariamente pelas classes C e D, que gasta menos do que os R$ 2,50 (1,98 no Cartão do Trabalhador) do ônibus que sai daqui a pouco para poder sonhar com a bolada. Prazer, minha turma.

Lá chegando, peguei um cartão e, em uma concessão à matemática, dei uma espiada no quadro com as dezenas da semana anterior. Nestas, eu não apostaria. Confiante no fato de que é bem mais fácil cravar seis em 54 do que em 60, dei uma examinada nas oito pessoas que estavam na minha frente. Não foi uma boa idéia. A agência era freqüentada por gente com pinta de ser mais pobre do que eu.

Exatamente antes de mim, uma mãe arfava com a filha no colo. Um coroa carregando uma sacolinha de farmácia, duas adolescentes em uniformes da escola pública, um casal inter-racial, um motoboy, uma manca (cuja deficiência só percebi quando claudicou em nossa direção); todo mundo olhou para trás e fez festinha para a menina. Entretanto, ninguém cedeu o lugar para a mulher que a carregava. Sorri. A criança achou que fosse para ela.

Saí mais animado do que entrei. Aquela gente precisava, mas não merecia mais do que eu.

***

Não acertei nenhum número. Na próxima acumulada, vou jogar na lotérica de Jurerê Internacional. É do feitio da justiça: aparecer em um lugar onde seja estritamente desnecessária.

Eu teclei “na próxima”? Passou.

20080517

20080513

Que sirvam nossas façanhas de modelo a toda Terra

/|||\ Pela primeira vez, Carlos Heitor Cony cita alguém que conheço*. O escritor abriu sua coluna deste domingo na Folha descrevendo Simon Reynolds como “crítico inglês de música pop, escrevendo para jornais não necessariamente ligados à temática que escolheu, autor de Bring The Noise”. Em algum desses jornais não necessariamente ligados à temática que escolheu, Reynolds reclamou que “há opiniões demais sobre música”, proporcionando o gancho que Cony utilizou para abordar “a pobreza da abundância” – e chega de aspas. Duvido que o colunista tenha lido o livro mencionado. Se leu, dá licença que eu preciso passar ali rapidinho antes de pedir para sair.
* Mentira meramente estilística

/|||\ Imperdível a história publicada no caderno Cultura do Diário Catarinense do último sábado, na qual o escritor Raul Caldas Filho lembra a visita de João Gilberto a Florianópolis em 1961. Vaia de bêbado não valia já naquela época.

/|||\ Nada como uma efeméride para transformar o passado em dinheiro. Por conta dos 40 anos do movimento que levou a juventude a protestar contra todas as instituições, a Conrad imprimiu e está vendendo Paris: Maio de 1968. Em 2003, o mesmo livro existia somente em versão online, oferecida gratuitamente no site da editora. Hoje, a pretensa transgressão sobrevive na internet – por sete dias ou 100 downloads, o que vier primeiro.

/|||\ Santa Catarina na edição corrente da revista inglesa Monocle. Como o conteúdo integral está disponível só em papel, assessorias de comunicação do governo estadual que desejarem incluir a reportagem internacional no clipping deverão procurar nas bancas. Ganha um CD com as conversas grampeadas pela Operação Moeda Verde quem encontrar um exemplar em Floripa.

/|||\ Para desgosto dos amantes do futebol-arte – definido por Eduardo Bueno como “coisa de viado” –, o time de Deborah Secco começou ganhando. Contra o mesmo adversário, com o mesmo placar e com gol na mesma trave onde, em 1981, a equipe da imortal jaqueta tricolor levantou sua primeira taça na competição. Pintou o campeão.

20080510

Camiseta nova para sair no sábado #8

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Em homenagem a todas as mães, mesmo as que não gostam de Iron Maiden.

20080505

Dez triângulos e um segredo

Chegou a conta do telefone com o custo daquela falcatrua dourada: R$ 11,11. O embaraçoso não é descobrir que, tirando uma ligação para a casa dos meus pais, foi a chamada mais cara que fiz em abril. Nem que ainda não entendi por que a soma dos números de um eqüilátero, um isóscele e oito escalenos era 970. O pior de tudo é constatar que fiquei OITO MINUTOS respondendo um questionário banal antes de me ligar e desligar, na tentativa de salvar o pouco de dignidade que me restava.

Vai passar.

20080503

20080502

Você me faz sentir como se eu nunca tivesse nascido

Circula há tempo por aí e ATÉ o Matias já fez matéria sobre. Baixei-o em 2006 e, desde então, poucos livros disponíveis na internet me deixaram com tanta vontade de imprimi-lo: a história do melhor disco dos Beatles. Ray Newman, um funcionário do governo inglês, dedica-se a desvendar como a banda migrou do iê-iê-iê para o “estado da arte” no pop. O autor mostra que o processo passou pela disposição em experimentar. Seja no plano técnico, com instrumentos, métodos e sonoridades; seja no metafísico, por meio de alteradores da percepção, revisão de velhos pontos de vista e, conseqüentemente, compreensão não-cartesiana dos fatos. João botava o LSD, Paulo trazia a vanguarda e Jorge encontrava explicação dedilhando a cítara indiana. Ringo achava tudo muito louco.

Mais espantoso ainda é como nenhuma editora se interessou em publicar Abracadabra no Brasil. Combinaria que é uma beleza com a investigação a respeito do ambiente que cercou a criação de Sgt. Peppers (é da mesma banda...) ou, para ficar na linha de “biografia de álbuns clássicos”, com os bastidores de Dark Side of the Moon, do Pink Floyd. Está dada a dica. Se rolar, quero o meu.