20090223

Anotações sobre a sexualidade e o amor*

#191
Aviso na parede de um bar: A mulher nasce puta e a sociedade a corrompe.

* Técnicas de Masturbação entre Batman e Robin, de Efraim Medina Reyes.

20090220

Cinco músicas redescobertas em 2008

Coming Up, PAUL MCCARTNEY (1980) | Ninguém mandou a Fox reprisar, em uma madrugada qualquer, Lisa, a Vegetariana, da temporada de 1995 dos Simpsons. Nessas de não comer carne, a chatinha acaba conhecendo Paul e Linda, notórios adeptos da soja, no terraço da loja de outro herbívoro, Abu. O episódio termina com o porco do churrasco de Homer nos ares, voando enquanto rola Baby, I’m Amazed, do beatle solo. Os créditos ainda passavam na tela e eu já estava procurado a coletânea de McCartney (Wingspan) para ouvir a canção inteira. Escutei, senti, DUBLEI. E, já que estava com o CD à mão, aproveitei para botar também uma daquelas prediletas há um tempão esquecidas. Hit absoluto, total e inapelável disco music com a grife do gênio da raça, para a gente sempre lembrar quem é que domina esse negócio de pop, seja em que estilo for. Minha relação com proteína animal continuou a mesma ao longo do ano, mas a trilha sonora ganhou um achado e tanto.



To Look at You, INXS (1982) | Tem criatura que coloca o grupo australiano na categoria de guilty pleasure. Daqui da minha laje, só me resta lamentar pelo cidadão que renega seus tesouros da juventude em nome de uma atualização estética que, não se iluda, não apenas denuncia ainda mais a sua velhice como também o deixa caricato. Essa defesa ferrenha é para avisar que o mundo marcou ao descobrir a banda somente a partir do platinado Kick (1987). Cinco anos antes, Michael Hutchence e os irmãos Farriss já praticavam pop destinado aos litorais além da gigantesca costa australiana. Com direito a um certo clima de tristeza para que o calor venha mais quente.


Reeling in the Years, STEELY DAN (1972) | À simples menção de Steely Dan remete a ambientes elegantes, noturnos, sensuais; sensação incrementada por audições maciças de Do it Again, Babylon Sisters ou Hey Nineteen. Com Reeling in the Years, o cenário muda para uma estrada que, com a guitarra como guia, vai ficando cada vez mais sinuosa o que não impede de se topar com uma silhueta pedindo carona no lusco-fusco do final de tarde. Chegando mais perto, a imagem se define: um umbigo de cabelos soltos, mochila nas costas e pulseirinha no tornozelo. Preciso reduzir.


A Dança, LEGIÃO URBANA (1984) | Como ninguém conhecia Gang of Four na época, o punk-funk do primeiro disco do (ainda) quarteto passava por coisa nova no incipiente rock nacional, mais preocupado em imitar o Police. O fato de nunca ser mencionada muito menos gravada - em tributos caça-níqueis diz muito sobre a música que melhor envelheceu da banda, cuja verso até hoje encerra qualquer discussão eu-contra-o-mundo: Mas você nunca dançou com ódio de verdade.


Primitive Painters, FELT (1985) | Resquício do quarto disco da banda inglesa (Ignite the Seven Cannons) incluído no pacote de vinis lançados pela Stiletto no país na década de 1980. Apesar de desenterrado em uma coletânea baixada de bobeira, o duplo clique sobre o arquivo da música nada teve de aleatório, independentemente de quantas vezes a ação foi repetida. Afinal, não é assim que se trata um dueto com a celestial voz de Liz Frazer, dos Cocteau Twins.

20090218

Doze músicas de 2008:
4) CHANGES, Van She

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“Strangers”, “Cat & The Eye”, “Kelly”... Muitos foram os hits particulares do simpático disco de estréia do quarteto, outro australiano que atravessou o oceano a bordo de sintetizadores e guitarras para conquistar o continente. Sua música com maior potencial é também a mais doce: pop perfeito, magnificente sem abdicar da descontração inerente às produções que almejam o rádio. Isto é, se ainda existisse rádio.

(extraída do disco V)

20090217

Doze músicas de 2008:
5) DANCE WIV ME, Dizzee Rascal

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Dizzee Rascal é daqueles artistas dos quais o freguês leva o disco inteiro atraído por uma música e descobre que só aquela é que prestava. Pelo menos agora o rapper inglês jogou limpo, reservando seu brilhareco eventual unicamente para o formato single. Acompanhado por Calvin Harris (a voz branca do refrão) e Chrome (levantando a bola na ponte), ele troca o carão pela arte de fazer bumbuns respirarem. Não há assadura que resista.

(extraída do single Dance wiv me)

Doze truques de 2008:
5) BABY, Breakbot

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Em um ano no qual França e Austrália ditaram o pop eletrônico, nada mais natural do que egressos dessas cenas unirem suas habilidades para ampliar a supremacia. É o que acontece quando a dupla Pnau, de Sidney, encontra Breakbot. Os remixes do parisiense são reconhecíveis pelo timbre do teclado, pela gorda linha de baixo e pela cadência, tudo sempre muito suave. Em outros tempos, isso era chamado de melodia.

20090216

Doze truques de 2008:
6) PAPER PLANES, DFA Remix

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No EP de remixes da melhor música do último disco de M.I.A., a racinha do selo nova-iorquino DFA transformou-a em uma faixa digna de um catálogo que abrange LCD Soundsystem, Rapture e demais expoentes do dance-punk. Traduzindo, significa que as camadas originais foram limadas em troca de uma levada que deu à cingalesa um groove que ela nem imaginava que tinha. Certeza de que o bebê vai preferir esta versão.

Doze músicas de 2008:
6) HEARTS ON FIRE, Cut Copy

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O trio australiano reuniu tanta música bowa em seu disco que fazedores de listas podem se dar ao luxo de dispensar “Lights & Music” sob o pretexto de que em 2007 o single já bombava – e apontar uma legítima do ano passado. A referência imediata continua sendo o lado mais pop do Depeche Mode, reforçado pelos gritinhos para cima e por uma guitarra que evoca New Order para deixar não só os corações em chamas.

(extraída do disco In Ghost Colours)

20090213

Doze músicas de 2008:
7) REPETITION KILLS YOU, Black Ghosts

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O vocalista Simon Lord veio do Simian. O DJ Theo Kating, dos Wiseguys. Juntos, cunharam um electro-pop retratado por elementos macabros (vide capa e nome). O assombro, porém, ocorre mesmo é em pistas sutilmente indies principalmente se o gorila sábio Damon Albarn estiver à vontade no microfone, reproduzindo os maneirismos de seus projetos paralelos. Sim, a repetição mata. Mas, diz ele com propriedade, a dança precisa dela para funcionar.

(extraída do disco The Black Ghosts)

20090211

Cinco blogs que mandaram muito bem em 2008

ALTOVOLTA | A efígie de Zico na versão 2009 do banner não é gratuita: só o Flamengo rivaliza com o judaísmo entre os assuntos que renderam os textos mais inspirados. Para David Butter, futebol e religião se discute, sim apesar de a lucidez que lhe ilumina a fé no coração fuja quando está com a bola no pé. Post memorável: Minha alma morreu.

A NOVA CORJA | Melhor a cada ano, desde quando ainda estava abrigado no Insanus. Também, sobra matéria-prima para a gauchada atestar a demência política do Brasil, seja nos posts, seja nos banners que mudam ao (dis)sabor dos fatos. Tanto que não foram poucas as vezes em que os gaudérios morreram lentamente ao mostrar que o rei está nu e, eventualmente, ao pautar a grande imprensa (sem levar o crédito). Tag memorável: Políbio Braga.

A TORRE DE MARFIM |Bem-vindo ao mundo de F. Arranhaponte e Marcos Matamoros, um lugar onde a realidade seria mais risonha se não estivesse na frente de um espelho. Da dupla vieram dois comentários que chegam a dar inveja, de tão definitivos: O PMDB é o Brasil, na sua forma inutilmente complexa e enjoadamente corrupta de não ser nada e O maior elogio [à esquerda] é a merda que deixaram de fazer. Post memorável: Eu, brasileiro, sou antes de tudo um fraco.

IMPEDIMENTO |Outro que, depois de ser incubado no Insanus, trocou o dormitório coletivo por um puxado individual alugado no WordPress. Fazendo do repúdio aos milionários clubes europeus a sua ideologia, enfoca o pegado futebol latino-americano com paixão, humor e pontos de vista inconcebíveis para os profissionais da crônica esportiva. Nem parece coisa de colorado. Post memorável: E Deus criou a vergolha alheia.

10,000 WORDS |Ferramentas, aplicações e dicas em que a tecnologia é aliada do jornalismo. Recomendado tanto para aqueles que se consideram os interativos da paróquia por colocarem online um vídeo que roda apenas com o navegador da Microsoft quanto para teimosos como eu, que não usam um décimo dos recursos que a internet proporciona. Culpa do Skabruska. Post marcado com estrela: 7 Eye-popping interactive timelines (and 3 ways to create one).

20090202

Doze truques de 2008:
7) SPIRITS IN A DUBWORLD, DubXanne

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Rolou com o Pink Floyd. Enganou com o Radiohead. Então, por que não daria certo com o Police, cuja matriz já é reggae? O desafio, aí, está em aprofundar as incursões jamaicanas do trio, acendendo o dub que Sting não tragou. Assim, “Spirits in a Material World” desaba em uma gravidade que se equilibra entre a ambiência que refresca e o deleite dos cabeçudos. Quanto maior a queda, maior o desfrute.

20090201

Luiz Henrique, 70

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(publicada no jornal O Catarina #67, da Fundação Catarinense de Cultura, em novembro de 2008)

Sua obra não consta dos inúmeros shows, exposições e produtos alusivos ao cinqüentenário da bossa nova, estilo ao qual é freqüentemente associada. Seus discos nunca foram relançados em edição nacional. Seu nome aparece uma única vez no livro
Chega de Saudade, a história definitiva do gênero escrita por Ruy Castro. Às vésperas de se completar 70 anos de seu nascimento, Luiz Henrique Rosa – ou só Luiz Henrique, como assinava – permanece um virtual desconhecido no Brasil.

Já foi pior. Iniciativas como o documentário Luiz Henrique – No Balanço do Mar (2007) da cineasta Ieda Back, e o disco-tributo A Bossa Sempre Moderna de Luiz Henrique (2003), idealizado por uma agência de publicidade com a participação de Ivan Lins, Elza Soares, Luiz Melodia e Martinho da Vila, entre outros, reavivaram o interesse pela sua música – em Florianópolis e olhe lá. Não vai aí nenhuma crítica, apenas uma constatação: o cantor e compositor catarinense conquistou mais do que esperava no exterior e menos do que poderia no país.

Os rumos que sua carreira tomou ajudam a explicar essa aparente contradição. Prestes a gravar um segundo LP no Rio e se consolidar entre os talentos da jovem música urbana que surgia, ele preferiu seguir para os Estados Unidos. Quando estava integrado à paisagem musical nova-iorquina, com uma penca de realizações profissionais no currículo, voltou. Apesar das oportunidades para se fixar no Sudeste, aterrissou na provinciana capital de Santa Catarina. Se a decisão desafiava a lógica e equivalia ao suicídio comercial, Luiz Henrique iria se reinventar. Longe da bossa nova.

Mas perto de sua gente. Nem que para isso tivesse de começar de novo na cidade pela qual se havia se mudado aos 11 anos e, desde então, era irremediavelmente apaixonado. Nascido em Tubarão e criado em Lages e em São José, o moleque descobriu no mar e nas garotas o estímulo que precisava para deslanchar no violão. Adolescente, passou a animar festas e clubes com suas seis cordas. No final da década de 1950, entrou na rádio Diário da Manhã, onde aprimorou sua arte com craques (e alguns de seus futuros parceiros) como o poeta Zininho e o pianista Aldo Gonzaga.

Em 1959, comandava um programa ao vivo na emissora, interpretando suas composições e sucessos da música norte-americana. No mesmo ano, saiu o LP Chega de Saudade, de João Gilberto. A “batida diferente” do baiano de fala suave arrebatou Luiz Henrique. Após excursionar pela região Sul a bordo do conjunto do maestro gaúcho Norberto Bandauf ao longo de 1960, resolveu arriscar – logo no reduto da bossa nova. No Rio, tocou nos night clubs do célebre Beco das Garrafas, e, em 1961, estreou com um compacto editado pela Philips contendo duas faixas próprias, “Garota da Rua da Praia” e “Se Amor É Isto” (esta última, com Zininho).

Em 1963, a gravadora lançou seu primeiro disco, A Bossa Moderna de Luiz Henrique (com o piano de Gonzaga), que emplacou as canções “Vou Andar por Aí” (de Newton Chaves), “Sambou, Sambou” (de João Mello e João Donato) e “No Balanço do Mar” (de Zil Rozendo) nas paradas. Em paralelo, seu autor protagonizou uma extensa temporada com Nara Leão no paulistano João Sebastião Bar, cuja clientela compunha-se de músicos, intelectuais, atores e badalados em geral. Tudo sugeria que o catarina cavaria seu espaço no rol dos nomes com os quais se habituara a cruzar em Copacabana, como Tom Jobim, Elis Regina, Jorge Ben ou Carlos Lyra.

O convite do saxofonista norte-americano Paul Winter para acompanhá-lo nos Estados Unidos abortou as negociações para um segundo disco, já programado pelo produtor Armando Pitigliani. A reboque da consagração da bossa nova naquele país, embarcou para Nova York com uma passagem de ida e volta pela Varig, 50 dólares (emprestados) no bolso, um violão na mão, uma promessa de 500 dólares do Itamarati e um vocabulário em inglês restrito à frase “I love you”. Entre idas e vindas, acabou ficando lá até 1971.

Nesse período, construiu uma discografia respeitável, seja solo (Barra Limpa, 1967) ou dividindo os créditos com o tecladista paulista Walter Wanderley (Popcorn, 1967) e com o cantor e compositor Oscar Brown Jr. (Finding a New Friend, 1968). Em parceria com o artista de Chicago, escreveu o musical Joy, indicado ao prêmio Tony (o “Oscar do teatro”). Trabalhou ainda com os conterrâneos Sivuca (com quem dividiu um quarto de hotel na Times Square), Hermeto Paschoal e Airto Moreira, com os gringos Stan Getz, Ron Carter e Chick Corea e teve suas músicas gravadas por Harry Belafonte, Liza Minelli e Bobby Hackett.

Pouco desse currículo foi considerado em seu retorno. Luiz Henrique estabeleceu-se – desta vez, para sempre – em Florianópolis disposto a desencavar as raízes do autêntico manezinho da ilha e a fundar uma gravadora. Em meados dos anos 1970, concebeu o show Bananeira Chorá, Chorá, aproveitando-se de cantigas folclóricas do boi-de-mamão. Para atender sua outra vontade, montou seu selo independente no bairro Itaguaçu, depois transferido para uma casa com vista para o mar na praia do Sonho, em Palhoça.

Pela Itagra (daí a denominação), lançou Mestiço, um LP com padrão muito superior às produções locais de 1975. De suas sete faixas, “Jandira”, “Sonhar” (ambas dividindo a autoria com Raul Caldas Filho), “Pra Não Deixar de Sambar”, “Sempre Amor” e a música-título foram gravadas no estúdio carioca Haway, com uma banda que incluía instrumentistas do quilate do arranjador e saxofonista J. T. Meirelles, do pianista Tenório Jr. e do baterista Edson Machado. As restantes, “Saiandeira” e “Dianne”, ganharam forma no Sound City, em Los Angeles, durante estada com Liza Minelli. A amiga retribuiria a visita passando o carnaval na ilha em 1979.

A despeito de tanto esmero, a distribuição precária comprometeu o desempenho do disco, marcando o final da carreira fonográfica de Luiz Henrique. Azar do mercado, porque ele continuaria registrando sua música em fitas caseiras ou à frente do programa Estamos Aí, exibido em 1978 na TV Cultura da capital. Dedicou-se ainda à produção de espetáculos, como a Sinfonia de Santa Catarina, concretizada em 1984 com Hermeto Paschoal; à coluna que mantinha no jornal O Estado e ao tablóide alternativo Galera da Ilha, que publicou suas aventuras no estrangeiro sob o título “Um Catarina na Broadway”.

Ex-sócio e contumaz freqüentador de bares, Luiz Henrique sossegou na gerência do recém-inaugurado Armazém Vieira em 1985. Ali, o marido de Patrícia e pai de Raulino e Manuel recepcionava os boêmios, promovia noitadas históricas e, claro, dedilhava seu violão. Para celebrar seus 25 anos de carreira, planejava reunir suas principais composições em um álbum duplo. Só não contava com a Kombi que, dirigida por um motorista embriagado, bateria violentamente em sua Variant na saída do serviço.

Na madrugada do dia 9 de julho, uma terça-feira, morria o catarinense que mais longe levou a música do Estado, deixando inédita a maioria do material composto nos últimos dez anos. De lá para cá, talvez o maior reconhecimento que recebeu tenha vindo do outro lado do mundo – e, ironicamente, por meio do estilo que abandonou. Em 1998, para comemorar os 40 anos da bossa nova, a subsidiária japonesa da Verve, gravadora responsável por seus discos no exterior, relançou em CD as obras-primas do gênero que detinha em catálogo. Entre elas, Barra Limpa e Popcorn. Mais recentemente, a memória do artista ganhou um site oficial, com biografia, fotos e discografia. A página de projetos, no entanto, está em branco.

Doze truques de 2008:
8) GOOD TIMES ROLL, Mike Genius

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Com essa Ric Ocasek não contava: ter um dos hits do primeiro disco dos Cars, de 1978, ressuscitado 30 anos depois como um electro dos mais festeiros. A gentileza (delito?) é de um produtor nova-iorquino, que desmonta a new wave com rajadas sintéticas perigosamente próximas da saturação maximal, não fosse a lembrança do original forte demais para ser atropelada por rótulos passageiros.