20130718

E bota exclamação nisso

 photo 000b91b7-387d-48e7-8138-6395085ffe4c.jpg

(resenha publicada no Diário Catarinense, 30/05/2013)
Pronuncia-se “chk chk chk”. Bom saber, porque o !!! ameaça obrigar mais gente a citá-la depois de conhecer seu quinto disco. Em Thr!!!ler, o dance-punk associado à banda desde a virada do século dispensa informação prévia para ser apreciado. Bateu, valeu. É como o quase homônimo álbum multiplatinado de Michael Jackson, só que de um mundo imperfeito. Não inclui todos – mas quem está dentro jura que descobriu um punhado de hits.
Aqui aparecem todas as qualidades dos lançamentos anteriores e nenhum dos defeitos. Há o frescor da autointitulada estreia (2000), a vocação para as pistas de Louden Up Now (2004), a inclinação indie rock de Myth Takes (2007) e o amadurecimento de Strange Weather, Isn’t It? (2010). Não é pouco, sobretudo se considerada a situação atual dos colegas geracionais e estéticos do mais nova-iorquino dos grupos californianos.



Formado em 1996, a banda sentiu-se em casa quando se mudou de Sacramento para a costa leste americana. À sombra ausente das torres gêmeas, sua proposta crua, quebrada e dançante encontrou respaldo na cena onde se estabeleceriam LCD Soundystem e Rapture, aos quais é geralmente comparado. Hoje, um encerrou as atividades, outro ficou devendo em seu mais recente trabalho.



E o !!!, que nunca foi tão aclamado assim, se acaba nas guitarras à Chic de “One Girl/One Boy” ou na pulsão sexy de “Except Death”, ambas com o vocalista Nic Offer gastando seu falsete liberal em refrãos impecáveis. Menos imediatas, “Californyeah” e “Slyd” deixam vazios que criam expectativas sempre surpreendidas e superadas pelo pop das soluções que adotam. Tem outras que merecem exclamações, basta absorver. Pontos não faltam.

20130716

Vapor barato

 photo a27362b7-75d4-4010-9d0a-22d97a877e7f.jpg

(resenha publicada no Diário Catarinense, 30/05/2013)
Na metade de 2012, o rapper Snoop Dogg anunciou que, em uma visita de 35 dias à Jamaica, havia obtido a graça. Ele seria a reencarnação de Bob Marley e, a partir de então, seguiria a religião rastafári, passaria a se chamar Snoop Lion e gravaria reggae. Fãs que já o viram fazer comédia, apresentar talk show, dirigir filme pornô e até emprestar sua voz para GPS pensaram se tratar de mais um papel representado pelo ídolo. Mas o fanfarrão não estava viajando.
O resultado da transformação é Reincarnated, melhor do que qualquer disco de rap que o ex-cachorro tenha lançado ultimamente. No documentário que precedeu o álbum, ele explica como encontrou Jah. Com os anciãos rastas, aprendeu a importância da paz e da comunhão com a natureza. De Bunny Wailer, ex-integrante dos Wailers originais e lenda viva local, recebeu o apelido leonino e a missão de reinventar seu espírito e, por tabela, sua carreira.
Iluminado por esta energia, Snoop recrutou Diplo e Major Lazer para produzirem o trabalho que revelaria o novo homem, pai, marido e artista que ele se tornou. A dupla, especialista em batidões, pega leve e só acelera em “Fruit Loops”, erigida sobre a levada do clássico “Under Me Sleng Teng”, de Wayne Smith, que em 1985 introduziu a era digital na música jamaicana. Nas demais faixas, a brisa e a brasa dominam.



Logo na abertura, a enraizada “Rebel Way” alerta que há muita morte, destruição, ruína e incompreensão na música – males não alheios ao passado gangsta de seu autor. “Smoke The Weed” atualiza o refrão original cunhado por Palma Dog em 1984 para um libelo em prol do mato queimado. Imersa na cultura da ilha, “Boulevard” remete ao rock steady, um dos gêneros que embalava os bailões de Kingston na década de 1960.



Assim que ganhou as ruas, Reincarnated dividiu opiniões. Wailer voltou atrás e o acusou de heresia. A crítica considerou apenas oportunismo – conclusão meio automática depois de ver a velha guarda de fora para dar lugar a participações dos nada ortodoxos Miley Cyrus e Akon. Mais óbvio, no entanto, é perceber que Snoop e reggae foram feitos um para o outro, em uma conexão que demorou para acontecer e, agora concretizada, parece evidente. O resto se dissipa na fumaça.