20150424

5 discos joinhas para você se deleitar

É tanto lançamento de tanto estilo que o cidadão até fica atordoado, sem saber por onde começar nem que caminho seguir. Em mais um serviço de utilidade pública e (de)formação de opinião, este veículo selecionou cinco novos discos que, cada um a seu modo, distinguem-se na paisagem musical. Do pop fácil ao instrumental cabeçudo, da raiz roqueira à roupagem moderninha, tem de tudo (em ordem alfabética, para evitar ciumeira) para você experimentar. Não precisa agradecer, a gente está aqui para isso.


All Possible Futures, MIAMI HORROR Expoente da invasão australiana às pistas abertas a algo mais orgânico do que superstars DJs, todos os futuros possíveis vislumbrados pelo segundo disco do quarteto australiano passam pelo pop dançante da década de 80. Prepare-se para levitar com climas espaciais, guitarrinhas funky e batidas disco music em uma festa onde o sol nunca se põe e a noite nunca termina. OUÇA “Love Like Mine”, “Wild Motion”, “Out of Sight”.





Dreamers, BARBARA OHANA A cantora carioca encontrou sua praia em São Paulo, onde floresceu a sonoridade que tem tudo para agradar fãs de Lana del Rey e Goldfrapp. Não à toa, todas as oito faixas deste EP são em inglês, idioma em que ela fica mais à vontade para desfilar um repertório de influências que vão de David Bowie a New Order. Sim, a moça é parente da atriz Claudia Ohana, a quem chama de tia. OUÇA “Ordinary Piece”, “Golden Hours”, “Karaoke Track”.





III, BIXIGA 70 O coletivo paulistano de dez integrantes destaca-se no cenário da música instrumental brasileira pela pluraridade de ritmos. Afrofunk, jazz, cumbia, adaptações de pontos de terreiro, levadas latinas, dub, guitarras angolanas e pífanos agrestes (entre outras manifestações rítmicas) convivem nas nove faixas, forjando um sincretismo autoral que desconhece barreiras a serem exploradas. OUÇA “Niran”, “100% 13”, “Mil Vidas”.





Kindred, PASSION PIT Vão longe os dias em que uma amiga da coluna definiu o single que colocou a banda americana no radar, The Reeling, como “alegria da juventude”. Parte dessa felicidade reaparece no terceiro álbum, no qual o vocalista Michael Angelakos trata seu transtorno bipolar com menos saturação e mais clareza em refrãos movidos a sintetizadores grudentos à primeira audição. OUÇA “Where the Sky Hangs”, “My Brother Taught me How to Swim”, “Five Foot Ten”.





Sound & Color, ALABAMA SHAKES Depois de deixar o mundo de joelhos com Boys & Girls, em 2012, os caipiras americanos trazem mais um punhado de canções sedimentadas em soul, blues e rock sulista. Mas não espere uma repetição do anterior, pois a banda enfrenta a famosa “síndrome do segundo disco” ampliando horizontes com sons e cores. E, claro, com a voz marcante de Brittany Howard para convencer. OUÇA: “Dunes”, “Gimme All Your Love”, “The Greatest”.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20150417

Crentes de que estão fazendo a coisa certa

Disco gravado, lançamento marcado, show agendado. O segundo CD do carioca Jonas Sá estava quase pronto para virar realidade em julho de 2014. Faltava somente um detalhe: prensá-lo. O material foi levado a uma fábrica, que o recusou. Em outra, também recebeu um não como resposta. Na terceira, idem. O drama só terminou em março, depois que a Ponto4 Digital aceitou o trabalho. Enfim Blam! Blam! saiu, revelando a razão para o atraso – que, se fosse apenas cronológico, não daria tanta dor de cabeça aos envolvidos: a capa.



A arte do álbum, criada por Júlia Rocha a partir de foto de Jorge Bispo, expõe o baixo ventre de uma negra (a modelo Anna Raulina) em todo o seu esplendor. Inspirado no pornô barato dos anos 70 e 80, o encarte feito pelo designer argentino Molokid é composto de colagens de mulheres com seios à mostra e dois homens nus, um dos quais com o membro ereto. Os fabricantes procurados negaram o serviço alegando que coxas, umbigo, púbis, pelos, peitos e pênis poderiam chocar a clientela religiosa, atualmente a maior consumidora de mídia física.

Entendeu? Ainda que não seja prudente desprezar o poderio de um segmento capaz de provocar mudanças no enredo da novela das nove se alguma cena afrontar seus princípios, a atitude não teve relação com moralismo. O que moveu a censura foi grana – ou o medo de perdê-la caso o público gospel começasse a cancelar encomendas de um fornecedor por considerá-lo obsceno. Na boa, até desanima falar da manha de Sá em casar balanço black com eletrônica, bancando Prince no falsete liberal de músicas tipo “Sexy Savannah” e “Gigolô”. Melhor admitir que o mundo agora “é assim mesmo” e descolar um daqueles livros de colorir para pintar como eu pinto.

DATAS QUADRADAS ||||||| 28 ANOS
O QUÊ A estreia da banda paulistana Gueto, com o disco Estação Primeira, em 1987.
QUEM Quatro garotos da zona norte que sempre gostaram de um suíngue forte.
POR QUÊ No Brasil de então, não tinha essa de fusão, mistura, crossover. Rock era coisa de banda. Hip hop era “break”. O grupo foi um dos pioneiros em promover a junção de universos que não se topavam, ensaiando o que anos mais tarde e por meio de outros artistas estouraria como funk-metal.
LEGADO Soul, samba, heavy & rap de bamba emoldurados pelos scratches do convidado DJ Marlboro e espalhados em pedradas como “G.U.E.T.O.”, “Você Errou”, “Uma Estória” ou na faixa-título.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20150410

Maluco total na loucura real



Com no mínimo 13 anos de estrada no lombo e três discos na algibeira, o Cidadão Instigado chegou naquele estágio da carreira em que pode se dar ao luxo de ter algumas certezas. Uma delas é de que só será popular entre a massa se houver uma mudança radical nos valores que regem as paradas de sucesso. Tem artista que, quando chega a essa conclusão, entra em parafuso ou parte para outra. O grupo cearense, não. Simplesmente ligou o f***-se e cunhou Fortaleza, seu trabalho mais maluco e, por mais paradoxal que pareça, centrado.

Nenhuma palavra que se escreva aqui vai conseguir traduzir o arrebatamento provocado por essa nova investida (disponível para download gratuito no site da banda) do quinteto liderado por Fernando Catatau. É um acerto de contas com suas as origens, não apenas geográficas – ao batizar o trabalho com o nome de sua cidade-natal –, mas sobretudo conceituais: toda uma tradição de nordestinos alucinados & apocalípticos que vai de Raul Seixas a Zé Ramalho, sem abrir mão do melhor do rock setentista que pirou o cabeção deles.

Repente progressivo, brega psicodélico, Pink Floyd no agreste; tantas são os caminhos sugeridos que que destacar alguma música periga reduzir a experiência. À primeira audição, o vivente se encanta com “Dizem Que Sou Louco por Você” e “Os Viajantes”, o mais próximo de pop que se encontra na paisagem. Depois, a doideira corre solta em “Ficção Científica”, “Land of Light” ou na faixa-título. Em 2005, o Cidadão Instigado cantava que “é complicado procurar alguma coisa onde não existe nada”. Em Fortaleza, a beleza está na própria busca.

Homenagem hermana
Esse lance de homenagear alguma cidade no nome do disco também pegou Florianópolis. E nem veio de manezinho: foi um argentino, Sebastian Litmanovich, que lançou um álbum xará da Capital. Assinando como Cineplexx, o hermano descreve o trabalho como “um coquetel de sons dançantes – disco music, bossa, afrofunk, eletrônica e pop – que transporta o ouvinte para um lugar exótico onde os amantes passeiam no verão, guiados pelo horizonte e pelo mar até a ilha mágica”. Com certeza ele não estava falando de Canasvieiras (brincadeira!).



LOCAIS
////// Amanhã os Lenzi Brothers apresentam o sétimo disco, Quatro Rodas no Chão, em show na Galeria Bar, em Lages. Apesar de dois terços do grupo não morar mais na Serra Catarinense desde 2004, o guitarrista e vocalista Marzio Lenzi explica que a cidade foi escolhida “pela sua forte ligação com as raízes da banda e público caloroso”. Somente no dia do lançamento, o rock musculoso com influências de blues das 12 músicas inéditas (de um total de 14) poderá ser baixado na fanpage da banda no Facebook.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20150403

Retorno de Saturno traz Blur de volta



Cada planeta leva um determinado tempo para completar uma volta em torno do Sol. A Terra demora 365 dias. Plutão, dois séculos e meio. Chama-se de “retorno de Saturno” o período de 30 em 30 anos em que o planeta dos anéis encontra-se no mesmo ponto celestial onde estava no nascimento da pessoa – daí o fato de essa idade representar uma fase de amadurecimento emocional e profissional. É o momento em que a criatura assume uma postura séria diante da vida, definindo seu futuro a partir das escolhas e decisões que tomar.

Os peixes que são embrulhados nesta coluna (os moluscos preferem a versão online) devem estar se perguntando o que isso tem a ver com música. Tudo, se o tema for a triunfante volta do Blur. Com lançamento previsto para 27 de abril, o disco The Magic Whip vazou na internet e mostra o quarteto mais ambicioso do que aquele que na década de 1990 disputava o topo das paradas inglesas com o Oasis. Essa metamorfose começou em 1998, justamente quando o líder do quarteto, Damon Albarn, comemorava o 30º aniversário.

Na época, o vocalista não se acomodou no reino do britpop e foi desbravar outras paragens. De lá para cá, montou uma banda de desenho animado (Gorillaz), formou dois supergrupos (The Good, the Bad and the Queen e Rocket Juice and the Moon), gravou ritmos africanos (no álbum Mali Music) e se aventurou solo (em Everyday Robots). Todos contribuem para que o primeiro disco do Blur desde 2003 levante diversas questões dentro do que o guitarrista Graham Coxon define como “sci-fi folk”. A resposta, por mais cético que você seja, está na astrologia.

Destra-Wado
Após uma quase irreversível inclinação para o “lado Marcelo Camello da força”, Wado dá uma sacudida no disco 1977, disponível para download gratuito em seu site. Batizado com o ano de nascimento do músico, o oitavo álbum do catarinense radicado em Maceió traz guitarras mias pesadas e brilha bonito em “Palavra Escondida” (parceria com Zeca Baleiro), “Um Lindo Dia de Sol” e “Menino Velho”.



POP POR TABELA ||||||| DOIS TONS

Odair José
LANÇAMENTO Dia 16
HISTÓRICO “Rei das domésticas”, sempre foi sucesso de público e fracasso de crítica,
tornando-se cult de uns tempos para cá
INFLUÊNCIAS Rock, folk, country
SUCESSO DO PASSADO “Pare de Tomar a Pílula”
MOMENTO ATUAL Redescoberto pela juventude, quer ser reconhecido como roqueiro contestador



Seu Jorge
LANÇAMENTO Músicas para Churrasco II
HISTÓRICO Apesar da origem humilde, sempre fez mais sucesso na zona sul carioca do
que entre o povão, situação que vem mudando com os últimos discos
INFLUÊNCIAS Samba, funk, soul
SUCESSO DO PASSADO “Burguesinha”
MOMENTO ATUAL Morando em Los Angeles, faz canções com apelos cada vez mais populares



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)