20180516

Pretensão e arte andam juntas na volta dos Arctic Monkeys

Decorridos cinco dias do lançamento, o tão aguardado sexto disco dos Arctic Monkeys continua dividindo coraçõezinhos indies. Tem gente que detestou, gente que a-mou, gente que ainda está confusa e gente indiferente – todas com a mesma intensidade e precipitação típicas do mundo feito de novidades que perdem qualquer apelo tão logo nascem. Por aqui, a única certeza é de que Tranquility Base Hotel and Casino fica melhor a cada audição.

Em vez de tentar reproduzir a pegada com a qual ampliou seu público de forma exponencial há cinco anos, a banda inglesa surpreendeu as expectativas com um álbum imprevisível. Massa, como o Radiohead fez em 2000, quando desafiou o senso comum com Kid A na sequência do estourado OK Computer. Sim, mas demais mesmo foi o caminho tomado pelo bando de primatas liderado por Alex Turner para eliminar as comparações com o antecessor AM.

Pistas de que o guitarrista e vocalista andava se satisfazendo com outros sons, poucas batidas & alguma pulsação vinham do Last Shadow Puppets, o projeto paralelo que o ocupou em 2016. O que ninguém supunha era o quanto o solteiro de 32 anos – desde os 22 na fita e antes dos 30 dono de um patrimônio de mais de 9 milhões de libras (cerca de R$ 45 milhões), uma das pessoas mais cool do planeta para a imprensa inglesa – já estava farto do rrrock.



De cara, o pasmo pela discrição das guitarras soterra qualquer outra impressão sobre o disco. Exceto esta “Four Out of Five” recém-promovida a single, com potencial para ser lado B extravagante na obra anterior, nada se assemelha ao histórico do grupo. O piano, que Turner aprendeu a tocar ainda criança e retomou ao ganhar um em comemoração ao seu retorno de Saturno, domina o cenário. Baixão só chega chegando, senão nem aparece.

Tudo é lento, retrô, meio classudo, meio bregoso. Embora nenhum refrão marque, o clima não sai da cabeça. É sério? Vencida a cabreirice, “Star Treatment”, “American Sports” e a faixa-título revelam que, na proposta do macaco-mor, a Base da Tranquilidade (pedaço da lua onde o homem pisou pela primeira vez, em 1969) que batiza o trabalho é um ponto do espaço que orbita em torno de astros como David Bowie e Serge Gainsbourg.

Nem sempre, porém, a viagem transcorre em céu de brigadeiro. Bem-vindos solavancos ocorrem em “She Looks Like Fun” e “Batphone”, quase experimentais se comparadas com a atmosfera reinante. A recepção no hotel e cassino fica por conta de “Ultracheese”, uma das baladas mais passionais dos Arctic Monkeys. Graça e mistério, conforto e desalento, desprendimento e pretensão – em um disco de música pop, ora pois.

Há uma citação que cabe à perfeição para explicar qual é a sensação provocada ao final dos 40 minutos consumidos pelas 11 faixas. É de Steve Jobs, e por aí você tira o quão longe os Arctic Monkeys foram; para que uma frase que provavelmente se referia a algum I-treco servir como comentário definitivo sobre, vale repetir, um disco de música pop. Ei-la: “A moda é o que parece bonito hoje mas irá parecer feio depois; arte pode ser feia em um primeiro momento, mas se torna bonita depois.” Tipo isso.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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