Era uma vez um jogador de futebol inteligente. Tanto que resolvia cubos mágicos e lia livros com bastante letras, dois desafios dos quais os colegas de profissão fugiam como o diabo da cruz. E ainda começou a andar de skate, o danado! Precavido (outro atributo que o diferenciava de seus pares), preocupava-se com o futuro. Afinal, carreira de boleiro acaba cedo; é importante fazer o pé-de-meia enquanto o corpo e os reflexos funcionam na mesma velocidade do raciocínio.
Ele já tinha visto craques que ganharam fortunas terminarem como motoristas de aplicativo acreditando serem empreendedores e de jeito nenhum queria esse destino para si. Certa noite, logo depois de uma renhida partida contra uma equipe do interior, vencida com um gol nos acréscimos, tocou no assunto com o atacante do seu time. O companheiro então lhe disse para ficar tranquilo, que iria lhe apresentar um parça que sabia tudo de investimentos.
Não havia por que desconfiar da dica. Durante a conversa no vestiário, ambos estavam naquela situação em que é impossível contar vantagem: nus. Além do mais, conforme o amigo, o tal “mentor financeiro” ganhava a vida como coach, autor de livros de autoajuda e pastor. Ou seja, uma pessoa acima de qualquer suspeita, pensou o jogador inteligente. Bendita hora em que ele resolveu se abrir com um chegado sobre uma questão tão delicada!
Marcaram de se encontrar na saída do culto que o parça e o atacante frequentavam. A primeira impressão foi excelente. O cara não só entendia do mercado como pontuava cada frase com “Deus”, “família” ou “liberdade”. A promessa de lucro era tamanha que, de cliente, o artilheiro tinha virado sócio. Ele já ouvira falar daquela aplicação, mas não imaginava que pudesse render tanto: até 666% ao ano, de acordo com o especialista.
O lastro da empresa em pedras de alexandrita no Acre era o que faltava para o jogador inteligente se convencer e também lhe entregar suas economias. Agora era esperar e faturar. Em pouco tempo seu capital seria superior ao PIB de um país do leste europeu, calculou. Passados os seis meses de carência para a primeira retirada, os milhões de reais investidos renderam algo em torno de 0,5% do total. Deve ter ocorrido algum engano, acreditou.
Reclamou para o amigão. O amigão lhe aconselhou a orar. Cobrou o pastor. O pastor o chamou de chato. Jurou que jamais cairia em um golpe daquele novamente. Da próxima vez, depositaria seu dinheiro em uma instituição sólida, que opera às claras, sob regras e garantias fiscalizadas por órgãos reguladores. Como fez seu sobrinho, um moleque startupeiro que estava enriquecendo com fundos administrados por um banco do Vale do Silício.
PS: Claro que você entendeu a referência do título desta edição, mas quem ficou boiando saiba que é uma alusão aos Contos da Cripta, famosa série de terror baseada na história de quadrinhos homônima e exibida nos anos 1990 no Brasil.
PS do PS: É sempre constrangedor ter que explicar uma (suposta) piada.
(Extraído da newsletter Extrato. Assine já e garanta o seu exemplar antecipado todas as terças!)
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