20150109

Bons goles, bom som e bom papo



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

Um festival internacional de vinho e jazz. Em Florianópolis, terra da eletrônica e do sertanejo. No sossegado Rio Vermelho, distante da ferveção do norte da ilha. E não é que funcionou? A primeira noite do evento, na última quarta-feira, entregou exatamente o que prometiam os organizadores: boa música, boa bebida e boa conversa. Até domingo, serão 30 shows de artistas vindos dos Estados Unidos, França, Holanda, Chile, além de locais e nacionais.

A surpresa começava já na chegada. A pousada que sedia o festival fica em um terreno gigante com o palco ao fundo, cercado por uma pequena pedreira. Segundo o proprietário, o italiano Andrea de Socio, a arena improvisada comporta cerca de 500 pessoas. O espaço estava praticamente lotado, todo mundo sentadinho. Ali perto, outro ambiente foi destinado aos vinhos – 100 rótulos de 20 países, com 10 degustações por irrisórios R$ 20. Não é difícil imaginar o efeito arrebatador da combinação de tintos, brancos, rosés e espumantes com ritmos que iam além do jazz tradicional.

As atrações da estreia também deixaram o público boquiaberto. Na abertura, os florianopolitanos da Cia Trupe Toe mesclaram sapateado com composições próprias e clássicos da MPB como Upa Neguinho. O grupo, surgido em 2011 e com apresentações em Chicago (EUA) no currículo, é novidade até para os nativos. Em seguida, os também caseiros Trio Ponteio e Brasil Papaya trouxeram, respectivamente, a mistura de ritmos regionais (milonga, chacarera, tango, baião) e conexões com o rock (com direito a Beatles logo de cara).

Guitarrista do trio de David
Bennet Cohen rouba a cena


Quarto a se apresentar, o pianista nova-iorquino David Bennett Cohen [foto Cleir Machado/Divugação] era o nome mais esperado da noite. Ou, pelo menos, o artista com as referências mais famosas: integrou a banda Country Joe & The Fish nos loucos anos 1960 e tocou com Hendrix, Mick Taylor e Johnny Winter. Mas quem roubou a cena foi Dave “Doc” French, guitarrista da trio que acompanhava o titular do piano de cauda preto. Ele solou, cantou, assoviou, fez piada e convocou a plateia para se levantar e dançar, mantendo a vibração sempre lá em cima. O povo, devidamente embalado pelo blues e pelo sumo da uva fermentada, aproveitou os últimos acordes e as últimas taças da degustação.

Os goles continuaram para quem se dispôs a comprar uma garrafa. Bem como os shows, agora mais contemplativos, na batida da bossa nova do brasiliense (radicado na Capital catarinense) Gustavo Messina e dos cariocas do Trio da Paz. Para as próximas edições, uma sugestão: indicar que castas harmonizam com os instrumentos. Talvez cabernet sauvignon desça melhor com naipe de metais, enquanto pinot noir dialoga com cordas. No entanto, mesmo sem esse serviço, nenhum cheirador de rolha reclamou. Nem fãs de jazz.

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