A bibliografia sobre o movimento black brasileiro ainda é pequena, mas está crescendo. O mais novo integrante dessa turma da pesada é Dançando na Mira da Ditadura, disponível para download gratuito & legal. O livro do historiador Lucas Pedretti mostra – com documentos – a perseguição do aparelho repressivo do governo militar aos bailões no Rio de Janeiro nos anos 1970. Para os agentes do funesto Departamento de Ordem Política e Social (Dops), a cor da pele e o jeito que os frequentadores se divertiam era um sinal inequívoco de subversão. Naquele tempo, a alegria de viver já era ofensiva para esse pessoal ressentido.
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(Em 2017, outra obra similar me fez escrever o seguinte para o Diário Catarinense:)
Bem-vindo ao Brasil da década de 1970. Um país onde reina a igualdade, desde que sua pele seja da cor adequada. Impera a liberdade, desde que não ameace a soberania nacional. Abunda a fraternidade, desde que você saiba o seu lugar. Foi nesse contexto de instituições em pleno funcionamento que dos subúrbios cariocas emergiu uma cultura musical para dar voz, visibilidade e afirmação à juventude negra. A história é recuperada agora com passos coreografados, gírias e muito ritmo pelo livro 1976 – Movimento Black Rio, de Luiz Felipe de Lima Peixoto e Zé Octávio Sebadelhe.
Em 17 de julho daquele ano, uma reportagem assinada por Lena Frias no Jornal do Brasil descreveu a onda que bombava em mais de 300 bailes periferia adentro. Sem querer, o título da matéria acabou batizando o fenômeno, que já existia havia pelo menos cinco anos e até então não tinha nome nem se organizava como movimento: “Black Rio, o orgulho (importado) de ser negro no Brasil”. Em quatro páginas, a zona sul era apresentada a equipes de som e discotecários despejando funk e soul americanos para pistas lotadas por uma moçada guerreira e esperta.
Furacão 2000, Black Power e Cash Box disputavam o posto de donas da parafernália sonora mais potente. Mister Funky Santos, Ademir Lemos e Big Boy competiam para ver quem rolava os maiores sucessos do momento nas carrapetas. Gerson King Combo, Carlos Dafé e Banda Black Rio pediam passagem com trabalhos autorais. E, acima de tudo e de todos, pairava Tim Maia, representante-mor do groove gringo adaptado para a realidade local. De repente, a MPB descobria que “negro é lindo” e absorvia as influências. O cidadão de bem ligava a televisão e se deparava com um balanço diferente na trilha da novela.
Em uma época de ânimos acirrados e polaridade latente, a exposição dos brothers na mídia incomodava geral. A direita temia pela radicalização da luta contra o racismo. A esquerda reagia contra o que considerava um desprezo ao samba como legítima música dos despossuídos. O futuro próximo desmoralizaria ambos os lados. O movimento não morreria; iria se dispersar por diversos estilos. Um deles seria o funk carioca que pariu Anitta, hoje invadindo as paradas dos Estados Unidos. Não deixa de ser uma justiça poética para um movimento acusado de somente copiar o que vinha de fora.
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