20230403

Uma outra Florianópolis é possível



Ainda bem que abortei a edição da terça anterior para esperar por Gilberto Gil. Porque estava saindo um texto amargo, o avesso do que se propunha a ser uma celebração à capital catarinense na semana de seu aniversário. Apesar de comemorar 350 anos com uma cabecinha de 349, a cidade é muito mais do que as gentes estúpidas & hipócritas e as pessoas nefastas que a comandam. O show dele no domingo reforçou a sensação de que uma outra Florianópolis – inclusiva, colorida, engajada, poética, alegre – é possível.

Eu já tinha percebido uma vibe parecida na tarde de sábado com Brisa Flow. Ela, Gil e mais um monte de atrações faziam parte da programação da Maratona Cultural, quatro dias em que a cidade é inundada por arte e cultura, a maioria gratuitamente. Embora não seja o público-alvo da rapper mineira de origem indígena e nem conhecesse direito sua obra, me senti em casa: cheguei já na brisa e curto o flow desde antes de ser modinha. Aí foi fácil me integrar à plateia na escadaria do Rosário de tantas lembranças.

Acompanhada apenas por um notebook e um mixer que ela mesma pilotava, a moça rimou como se fosse uma popstar. Eu devia ser um dos únicos que não sabia cantar nada, anotando pedaços de letras para pesquisar o nome das músicas. Assim, descobri “Sonhos com Serpentes”, “Jogadora Rara”, “Cerquita”, “Fique Viva” e “Noites de Amor e Guerra”. Em alguma delas, ao citar mulheres, negras e originárias, um magrão ao meu lado, mais pálido que eu, surtou e começou a gritar “é tudo nosso”. Eu ri. A turma em volta tolerou.

No dia seguinte, Gil fecharia o evento a partir das 19 horas. De graça. Ao ar livre. Imagine a multidão: tinha o triplo. A fila para se aproximar do palco armado na Paulo Fontes, defronte ao antigo terminal de ônibus, dobrava a Praça XV. Mas não deu nem tempo de bufar, em menos de 20 minutos eu e minha garota estávamos no local. Quer dizer, no Miramar, a uns 300 metros da estrutura, o máximo que nos embrenhamos sem precisar roçar em outros corpos suados e poder tomar um chopinho na paz.

Foi lindo. Digo isso com a autoridade de quem não o viu direito e mal e porcamente conseguiu ouvi-lo por estar muito longe. Havia todo um clima porque na semana que antecedeu o show a Câmara local negara o título de cidadão honorário a Gil. A rejeição transformou o que seria uma homenagem protocolar – positiva para os doutos vereadores, insignificante para o artista – em notícia nacional. Em protesto, até um “baseadaço” entre a terceira e a quinta música foi programado pelo WhatsApp.

E Gil simplesmente (perdão pelo meu português castiço) cagou para tudo isso. Montou um repertório à base de reggae (“A Novidade”, “Não Chore Mais”, “Vamos Fugir”, “Esotérico”), forró (“O Xote das Meninas”, “Só Quero um Xodó”, “Esperando na Janela”) e hits mais manhosos (“Drão”, “Palco”, “Andar com Fé”, “Nos Barracos da Cidade”) e correu para aquele abraço. Para onde olhávamos, tinha gente de tudo quanto é cor, idade, classe social, gênero e, tomara, ideologia se divertindo.

Na saideira, “Toda Menina Baiana”, aproveitamos para escapar para o Bugio. Após uma breve escala em meio à juventude alheia à segunda-feira, esticamos o que restava do nosso vale-night em casa, desfrutando o que deus deu, o que deus dá.

(Extraído da newsletter Extrato. Assine já e garanta o seu exemplar antecipado todas as terças!)

Olha o que ele fez



A transmissão do jogo da seleção brasileira no sábado pelo canal de Galvão Bueno no YouTube atingiu 1,3 milhão de aparelhos conectados e alcançou 5 milhões de usuários únicos, com um pico de 1,5 milhão de pessoas assistindo. A Band, que também exibiu a partida, marcou 11,6 pontos de audiência. A liderança de audiência no horário foi da Globo, com 16,5 pontos na Grande São Paulo. Cada ponto equivale a 717 mil telespectadores.

Na volta do show de Brisa Flow tive a curiosidade de acessar o jogo no canal dele para ver como o “vendedor de emoções” se saía na nova plataforma. Vi um profissional desconfortável, tendo que dividir o protagonismo com youtuber e driblar falhas técnicas inconcebíveis em seu emprego anterior. Li que foi um sucesso – e pode até ter sido mesmo, não entendo nada disso –, mas me deu uma deprê.

PLAYLIST | o melhor o tempo esconde



Comecei solto, sustentei uma sequência adulta e depois descambei. Bem-vinda ao meu mundo.

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