20230508

A solidão da mãe normal



Um espectro ronda as mães de uma certa burguesia florianopolitana – o espectro dos banheiros que os(as) filhos(as) frequentam. Nem cinto de segurança no banco de trás do carro, tampouco merenda sem fritura ou refrigerante, muito menos depressão infantil: nada as atormenta mais do que a chegada da fase em que a sociedade começa a tratar suas crias como seres aptos a fazer xixi e cocô sem a supervisão de um adulto de confiança. De preferência, elas próprias.

Seria por questão de higiene? Exagero, pois nessa idade meninos e meninas já sabem se limpar – e se ainda não sabem, aí é que as mães deviam se preocupar mesmo. Medo da loira do banheiro? Bobagem, elas são as primeiras a falar para as crianças que isso é lenda urbana. Prevenção ao bullying? Paranoia, o que acontece no sanitário permanece no sanitário. Por mais que se especule algum motivo razoável, só a pedofilia justifica esse temor quase patológico.

Parcela significativa de mamães de pimpolhos que estudam em escolas particulares entram em pânico apenas em pensar que, longe delas, eles podem estar sentadinhos na privada sozinhos, à mercê de algum colega mais velho e/ou maldoso. Bem, se o Enzo ou a Valentina correm esse risco, talvez seja o caso de cogitar matriculá-los em outro colégio. Além disso, pesquisas apontam que na maioria esmagadora dos casos o abuso de vulnerável é cometido por parente ou conhecido.

Elas exercem a maternagem com tanto zelo que não ignoram essa triste estatística. Tanto que algumas também ficam ressabiadas com as filhas tomando banho com os papais. Os dois ali, aquele chuveiro gostoso, ensaboa daqui, aquela curiosidade, esfrega dali, vai que pinta um clima. Aventar essa possibilidade desafia a relação conjugal a tal ponto que, das duas, uma: ou a senhora deve se separar desse monstro que chama de marido o quanto antes ou procurar ajuda especializada.

Eu poderia listar mais 22 argumentos para desmistificar o banheiro como ameaça à integridade física e moral de pequenos e pequenas. Mas vou parar por aqui e dedicar estas últimas linhas à mulher que se comporta como uma pessoa normal quando se trata de filhos. Você que se sente solitária no grupo de mães de alunos da mesma série, que era ridicularizada por brigar para não ter aulas presenciais durante a pandemia, que ri de nervosa das ideias de suas pares disfuncionais:

Continue assim.

E, nunca, jamais, em hipótese alguma, considere acompanhar seu moleque no banheiro masculino. Porque se eu estiver lá, vou achar que é você que quer abusar de mim.

(Extraído da newsletter Extrato. Assine já e garanta o seu exemplar antecipado todas as terças!)

Foco no que interessa



Mandei a uma amiga a imagem acima (inteira), extraída de um telejornal local veiculado no dia 30 de março, ansioso para ver com o que ela ficaria mais escandalizada: com “o bom filho” ou com “apesar de todas as adversidades”.

Nenhum dos dois. A moça nem ligou para a citação bíblica e o eufemismo escolhidos com capricho pelo editor para homenagear a figura ilustre que voltava ao Brasil naquela quinta. Primeiro, perguntou quem era o apresentador. Ao receber minha resposta, comentou: “Nossa, nem reconheci, de tanto botox”.

Estou sempre aprendendo com ela.

PLAYLIST | foda-se o algoritmo



E o agro também, continua a canção, poética como um entardecer no campo.

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