20171201

Banda Black Rio chega com Maria Fumaça a Florianópolis

Brothers, sisters, manos & minas de todas as cores têm encontro marcado nesta sexta-feira com a Banda Black Rio, em Florianópolis. O grupo carioca se apresenta pela primeira vez na Capital em show que marca os 40 anos da estréia, Maria Fumaça, presença garantida em qualquer lista dos maiores discos da música brasileira de todos os tempos. Além dos temas do álbum, a banda promete enfileirar músicas da encarnação atual, iniciada no final da década de 1990.


A retomada da Black Rio é liderada pelo William Magalhães, filho do fundador, o mestre Oberdan Magalhães. O herdeiro, hoje com 52 anos, lembra-se bem dos ensaios da banda no estúdio e na garagem da casa dos avós. Fascinado com o que ouvia, o moleque decidiu que seria músico. Mas, em vez de se inclinar pelo saxofone do pai, encantou com o piano tocado por Cristóvão Bastos.

– Eles ficaram um mês criando o conceito da banda, a ‘fusão antropofágica’ de samba com ritmos norte-americanos – diz.

Essa sonoridade, segundo William, já vinha sendo buscada por nomes como Raul de Souza & Impacto 8 ou, principalmente, Dom Salvador & Abolição – do qual Oberdan e outro integrante da Black Rio, o trompetista Barrosinho, fizeram parte. Com Maria Fumaça, no entanto, a mistura deu uma liga especial. A brasilidade movida a jazz, funk e soul desembocou em um balanço original e contagiante, a ponto de a faixa-título servir como abertura da novela Locomotivas, da Globo.

Após três discos, a morte do saxofonista, em 1984, interrompeu a trajetória do grupo. William seguiu carreira, fazendo parte da banda que acompanhava Gilberto Gil por 10 anos. Em uma das turnês com o baiano pela Europa, ele esbarrou com o vinil de Maria Fumaça sendo vendido em Londres por 100 libras (cerca de R$ 400). Sem se identificar, perguntou ao comerciante o que aquele disco tinha para ser tão valorizado.

– O cara disse que era coisa rara, uma banda com um som único, um samba-funk. Onde eu ia, as pessoas lembravam, enquanto no Brasil a Black Rio estava ficando esquecida. Então resolvi voltar com o grupo para difundir o material da banda – conta.

Revitalizada com uma rapaziada nova, a Black Rio lançou em 2000 o álbum Movimento e emplacou a música “Carrossel” nas rádios. Mesmo assim, continuou maior no exterior do que aqui: os trabalhos seguintes, Rebirth (2002) e Super Nova Samba Funk (2011, com participações de Gil, Caetano Veloso, Elza Soares e Mano Brown), saíram pelo selo inglês Far Out.

– O reconhecimento lá fora é mais consistente, está mais vinculado à cultura musical do que a modismos.

A banda preservou todos os arranjos da fase clássica, garante William. Mas também incorporou elementos mais contemporâneos, modernizando seu apelo para uma molecada que nem era nascida na época de Maria Fumaça. É essa turma hoje se mistura com o pessoal que sempre curtiu o grupo e transforma os shows em um encontro de gerações. Todos unidos pelo groove irresistível da Black Rio.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20171024

5 lançamentos que curam, acalmam, aliviam & temperam

Às vezes bate um enfado pesado nesse negócio de “escrever de música”. Pô, o Brasil quebrando recordes de estupidez e patifaria a cada dia e o cara vem com papinho de “o disco novo do fulano é assim”, “o novo hit da beltrana é assado”? Em que planeta ele vive? Que bicho alienado! Mas as outras opções não são muito animadoras – entre alimentar a úlcera da indignação inerte ou adotar malabarismos retóricos para justificar a barbárie, faz mais sentido tentar amenizar a pressão com lançamentos sônicos que, como a erva daquela famosa canção, curam, acalmam, aliviam & temperam. A eles, então:



Beck, Colors
Conforme a lógica de alternar um disco folk com outro inclassificável, depois do plácido Morning Phase (2014) era a vez do loser mais bem-sucedido dos anos 1990 soltar um trabalho tingido pela sua concepção muito peculiar de pop. Os singles “Dreams” e “Wow” já antecipavam que o 13º álbum do californiano agradaria de primeira, apesar de alguns timbres, cadências e guinadas tipicamente não convencionais. Não fosse essa vocação para deixar tudo menos linear, potenciais hits como “I’m so Free”, “No Distraction” (que chega a lembrar o Police!) ou a faixa-título poderiam até almejar o grande público. Mas aí não seria Beck.



Cut Copy, Haiku from Zero
Os australianos militam na esfera indie-dance, o que ou garante presença tanto em playlists descolados quanto em pistas arejadas ou desagrada ambos. O quinto disco segue o formato dos anteriores: muita reverência ao tecnopop oitentista, melodias que parecem saídas de alguma coletânea de pérolas obscuras daquela década e caprichosos refrãos aderentes. Ou seja, nada que vá modificar a vida de ninguém, embora “Counting Down”, “Black Rainbows” e “Airbone” tenham boas chances de tornar o dia – e, dependendo do nível de dissipação, a noite – mais promissor.



Liam Gallagher, As You Were
Enquanto Noel brinca de abrir shows para o U2, o caçula dos Gallagher reaparece pronto para calar a boca de quem o acusava de não passar de um inútil que só não é sustentado pelo sistema de seguridade social inglês devido ao talento do irmão. Seu disco não nega o DNA, trazendo um punhado de canções naquele formato rock-para-tocar-no-rádio (“Greedy Soul”, “For What’s Worth”) que fez a fortuna do Oasis. Para viúvas da ex-banda, a distração é descobrir novas “Don’t Look Back in Anger” e “Wonderwall” no solo do antigo vocalista. A procura revela esses e outros similares aos sucessos dos torcedores do Manchester City.



Tim Bernardes, Recomeçar
A precocidade que leva um jovem, líder de uma banda elogiada, sentir necessidade de fazer um disco solo se justifica depois do verso que encerra a última canção. “A dor do fim vem para purificar”, canta o moço, antes de murmurar o verbo que batiza a música e o álbum. Aos 26 anos, Tim Bernardes sofre como se já tivesse carregado todo o peso do mundo nos ombros. Sem os companheiros d’O Terno, a visão agridoce que ele imprime à frente do trio vira melancolia, emoldurada ora por orquestrações, ora por arranjos delicados que deixam tudo mais triste e bonito. Como a esperança que emerge desta estreia.



Death from Above, Outrage! Is Now
Junto com o “1979” que limou da parte final do nome, os canadenses abandonaram qualquer pretensão modernosa. Se quando surgiu, em 2004, eles ajudaram a definir a onda dance-punk que decretava a obsolescência dos DJs, 13 anos depois o alvo é muito mais a bateção de cabeça do que o vaivém da cintura. A mudança foi benéfica: em vez de soar datada por revisitar o passado recente, a dupla se alinha a bandas revisionistas como Wolfmother e Rival Sons. As pauladas “Caught Up” e “Nomad” estão aí para mostrar que, ainda bem, o “som da pesada” não precisa ser tão derivativo nem tão literal.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170920

Rock in Rio: discurso e lacração demais, música de menos

Começou com fãs em desespero pelo cancelamento do show de Lady Gaga. Depois, a Vigilância Sanitária apreendeu os queijos do estande da chef Roberta Sudbrack pela falta de um selo de inspeção fiscal. Ao final, Anitta – vetada pela organização – anunciou que irá promover o próprio festival. Pensa: Lady Gaga. Vigilância Sanitária. Queijos. Estande. Chef. Selo de Inspeção Fiscal. Anitta. O primeiro final de semana do Rock in Rio foi divertidíssimo.

O festival chega à sétima edição alinhado com o que os clientes esperam. Quando surgiu, em 1985, o rock era o pop. Aí o pop virou um monte de coisa – com cada cada vez menos rock. Ficaram a marca Rock in Rio, mais forte do que a maioria das atrações, e o propósito de ser um festival pop. Só que um festival pop também virou um monte de coisa – com a música tendo um papel cada vez menos importante no pacote de “experiências” vendido a R$ 445 por dia.



Entre ações promocionais, área VIP, praça de alimentação com opções gourmet, ativações de marketing, espaço para games, campanhas publicitárias, brinquedos e propagandas, rolaram shows. E nem em cima do palco a música conseguiu ser protagonista. Encerrado o domingo, não se falava em nenhum hit, em nenhuma consagração ou mesmo de algum vexame. Mas bombaram manifestações que o mercado, a mídia e as redes sociais chamam de atitude.

Na abertura, a modelo Gisele Bünchen se emocionou ao discursar em defesa da Amazônia antes de Ivete Sangalo emendar com Imagine. A floresta voltaria a ser mencionada por Alicia Keys, acompanhada pela líder indígena Sônia Guajajara. Todas preocupadas com a ameaça à uma reserva ambiental representada pelo decreto assinado pelo atual inquilino do Palácio do Alvorada, que acumula processos em vez de sucessos.

Do mesmo jeito que o clássico de John Lennon festejado pela rainha do axé, o “fora Temer” puxado durante as passagens de Elza Soares, Blitz e Skank teve seu significado esvaziado. Ecoou muito mais como uma saudação típica de multidão, tipo “ah, eu tô maluco”, “uh, tererê” ou “bota pra f*”, do que um desejo de despejar o (segundo a Polícia Federal) “chefe do quadrilhão”. A corrupção acabou, as instituições estão funcionando, vamos beijar muito.

Liniker e Johnny Hooker juntaram as duas causas e se beijaram na frente de um cenário onde se lia “amar sem Temer”. Ainda na seara gay, a drag queen Pablo Vittar roubou a cena na apresentação de Fergie. Não fosse sua sexualidade, talvez nem citados seriam. Se os artistas não se incomodam com isso, beleza. Adam Levine, do Maroon 5, preferiu vestir uma camiseta contra as drogas estampada com uma folha de maconha, a erva maldita.

Nesse contexto, não espanta que os dois shows memoráveis tenham ignorado quaisquer bandeiras. Um, de Nile Rodgers, desfilou os hinos da disco music que o guitarrista e produtor cunhou a bordo do Chic ou a serviço de Madonna, David Bowie e Daft Punk. Outro, de Justin Timberlake, trouxe um especialista em entreter a massa com um pop impecavelmente embalado. Goste-se ou não, o ex-N’Sync é um profissional do ramo.

O Rock in Rio retorna nesta quinta e vai até domingo, com Aerosmith, Bon Jovi, Guns ‘N Roses The Who, Offspring e Red Hot Chili Peppers no palco principal. Além deles, o elenco escalado (Alice Cooper, Cee-Lo Green, Nightmares on Wax, Sepultura, BaianaSystem) permite supôr que a música – sobretudo o rock, que inusitado – vá superar o papo-furado e a “lacração”. Mas sempre haverá um Rogério Flausino ou um Dinho Ouro-Preto para não decepcionar a gente.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170912

Secos, molhados & revisitados

Desde que largou os Titãs, em 2010, Charles Gavin andava sossegado. Continuava envolvido com música à frente do programa O Som do Vinil (Canal Brasil) e coordenando a reedição de álbuns fora de catálogo de artistas nacionais, uma rotina tranquila se comparada à agenda como baterista de uma das formações mais icônicas do rock brasileiro. Até bater a saudade de estar em uma banda novamente – o que o levou a montar o Primavera nos Dentes, projeto de releituras dos Secos & Molhados que acaba de sair em disco.

— A ideia surgiu da vontade de voltar aos palcos. Mas fazer o quê? Tocar Titãs seria legítimo, mas poderia ser mal-compreendido, falarem que eu estava fazendo cover de mim mesmo — explica ele, por telefone, de sua casa no Rio de Janeiro.

A solução foi encontrada em um repertório com que o próprio Gavin já havia lidado em 1999, ao remixar a versão digital dos dois LPs do antigo grupo de Ney Matogrosso. Lançados originalmente em 1973 e 1974, ambos conseguiram um sucesso sem precedentes, chegando a superar campeões de vendas como Roberto Carlos. Em plena ditadura, lá estava aquele figura de sexualidade ambígua, rosto e corpo pintados, saracoteando na sala de estar do cidadão de bem.

— Lembro que tinha 12, 13 anos. Quando começaram a aparecer na TV, foi um fenômeno. Da criança a vovó, todo mundo gostava. Era provocativo, mas tão diferente que não tinha como a censura proibir. Entre a minha geração, eles são uma unanimidade. Quando tive certeza de que essa música era importante – e não só para mim – ficou claro o que eu faria — diz.



Definido o alvo, Gavin passou a recrutar os futuros companheiros. Para a guitarra, chamou Paulo Rafael, integrante do lendário grupo pernambucano Ave Sangria e há mais de quatro décadas diretor musical da banda de Alceu Valença. Com ele, veio o baixista Pedro Coelho, egresso do musical sobre Cássia Eller. A cantora gaúcha Duda Brack assumiu os vocais e, para completar o time, trouxe o violinista e guitarrista Felipe Ventura, da cena independente carioca. O nome surgiu de uma música dos Secos & Molhados.

— Pois é, alguém nos avisou nas redes sociais que em Florianópolis também havia um Primavera nos Dentes, foi uma coincidência.

A intenção inicial, confessa o ex-titã, era reproduzir a obra dos homenageados com a máxima fidelidade. No entanto, após alguns ensaios, o quinteto percebeu que algo não estava funcionando. Os timbres, a tecnologia e o contexto afastavam o resultado do que ele realmente se propunha. Ou, como admite Gavin, “parecia uma banda cover, tudo o que a gente não queria, que era honrar os Secos & Molhados”.

— Aí partimos para a recriação. Mantivemos a poesia, mas os arranjos são nossos. De “O Vira”, por exemplo, restou apenas o refrão. Delírio” é outra: mostramos para o coautor da música, Paulo Mendonça (que também assina “Sangue Latino” e “O Doce e o Amargo”) e ele entrou em um transe tamanho que não reconheceu nem a letra que havia escrito.

De fato, as 11 faixas revisitadas parecem até autorais, com todos os riscos embutidos em mexer em um repertório clássico. Segundo Gavin, quem poderia reclamar – Ney, Gerson Conrad e os demais integrantes do grupo –, aprovou as transformações. Com a bênção dos autores, o Primavera nos Dentes agora se prepara para ganhar os palcos.



Geração na ativa
Outros artistas associados aos anos 1980 que estão com discos novos na praça

Paulo Miklos, A Gente Mora no Agora
Este é o terceiro disco de Miklos, mas o primeiro após a saída dos Titãs, no ano passado. Por isso, ele encara A Gente Mora no Agora como uma estreia – e foi com tesão de principiante e experiência de veterano que se cercou de um monte de gente para celebrar a música brasileira nas mais variadas vertentes. A presença de parceiros de gerações tão diferentes contribui para a diversidade do álbum, mas também se reflete na irregularidade. Entre acenos a questões contemporâneas e resquícios de “MPB universitária”, o artista que já releu Noel Rosa no projeto Quinteto em Branco e Preto e interpretou Adoniran Barbosa no cinema se dá melhor quando investe em baladões românticos, como “Estou Pronto” (composta com Guilherme Arantes), “Todo Grande Amor” (com Silva), “Princípio Ativo” e “Risco Azul” (ambas com Céu).



Paralamas do Sucesso, Sinais do Sim
Cada álbum depois do acidente de ultraleve que deixou o guitarrista e vocalista Herbert Vianna paraplégico em 2001 é uma vitória, o que talvez justifique o otimismo que transborda do 21º disco do grupo já a partir do título. O sucessor de Brasil Afora (2009), no entanto, não traz tantos indícios assim para o ouvinte acreditar em um futuro melhor – pelo menos no que diz respeito à banda. O rock que o trio tinha a manha de conjugar com outros estilos como ninguém para forjar uma sonoridade brasileira aparece de forma convencional, muito aquém do já apresentado em trabalhos anteriores. Os ritmos afrocaribenhos, outro ponto forte nestes 34 anos de carreira, empalideceram (vide “Itaquaquecetuba” e “Sempre Assim”). Aí, nem a produção de Mario Caldato (Beastuie Boys) consegue dar jeito.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170908

Lemmy, o herói do disco de covers do Motörhead

Se existe um paraíso para onde vão os roqueiros desencarnados, provavelmente é um lugar com Under Cöver rolando em loop infinito. Trata-se de um disco de, adivinhe, covers. Mas não um disco de covers qualquer: é, acima de tudo, um disco assinado pelo Motörhead. Mesmo fiel às versões originais, a banda imprime sua marca a cada um dos 11 clássicos revisitados entre 1982 e 2015. Nem poderia ser diferente, em se tratando do grupo liderado pelo eterno Lemmy Kilmister. Que homem!



Poucos personificam com tanta propriedade os ideais do rock como o baixista e vocalista falecido há quase dois anos. Feio, sujo & malvado, ele se sente em casa em “Breaking the Law” (Judas Priest) e “Whiplash” (Metallica), sócias do gênero musical pelo qual é reconhecido. Também se identifica com “Cat Scratch Fever” (Ted Nugent) e “Shoot ’em Down” (Twisted Sister), condizentes com o selvagem estilo de vida que sempre seguiu. Só por isso, o álbum já cumpriria a função social de conscientizar a juventude.

Apesar do jeitão ostensivo, porém, Lemmy não se limitava à música pesada. Algumas das releituras mais contagiantes miram canções de artistas de outros estilos, como “Rockaway Beach” (Ramones) ou “Jumpin’ Jack Flash” (Stones). Aquela voz inconfundível cantando “Heroes” (David Bowie) convence qualquer um de que o papo é para valer porque vem de um maluco adorável e autêntico, com imperfeições e idiossincrasias. Como são os únicos heróis em que dá para acreditar – seja apenas por um dia, seja for ever and ever.



Sempre bom
A rigor, Hitchhiker, o recém-lançado “disco perdido” de Neil Young, não é novo nem inédito. Foi gravado em uma noite de 1976 em um estúdio de Malibu, na Califórnia, e oito das 10 faixas já apareceram em trabalhos posteriores, ainda que com arranjos diferentes. As exceções são “Hawaii” e “Give Me Strength”, inspiradas pela separação entre o artista e a atriz Carrie Snodgrass. Tanto faz: o que importa é ouvir o imaculado canadense reproduzindo toadas como “Pocahontas” ou “Powderfinger” acompanhado somente por violão, gaita e piano. Sempre alentador, às vezes rústico, bonito demais.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170901

Queens of the Stone Age traz o rock para 2017

Fazer rock no século 21 é dureza. No lado artístico, equivale a investir em um estilo no qual os cânones já foram todos escritos e a linguagem parece ter se esgotado. No aspecto comercial, significa disputar mercado com sertanejo, funk (carioca), rap, R&B, eletrônica, qualquer música não movida a guitarras. Por isso, um disco como Villains, do Queens of the Stone Age no último dia 25, deve ser saudado com efusão. Sem reinventar a roda, a banda californiana conseguiu se renovar, e por tabela, sacudir a poeira do gênero em 2017.



Não dá para precisar o quanto Mark Ronson teve a ver com isso, mas a proeza passa pelas mãos dele. O produtor deixou o sétimo álbum do combo liderado pelo vocalista e guitarrista Josh Homme mais “para cima”. Favor não confundir com os serviços prestados a uma clientela que inclui de Amy Winehouse a Bruno Mars: já na abertura, com a introdução de quase dois minutos preparando o espírito para a entrada triunfante de “Feel Don’t Fail Me”, fica claro que a maldade continua sendo o maior patrimônio do grupo.



O que se pode creditar à produção é um frescor manifestado em timbres, cadências e pontuais intervenções, sempre potencializando a vocação da banda – sexy em “The Way You Used to Do”, densa em “Domesticated Animals”, frenética em “Head Like a Haunted House”. A herança zeppeliniana de “The Evil Has Landed” completa o ciclo de alternativas para o rock voltar a ter alguma relevância. Nem que seja apenas no nicho aonde foi confinado desde que o pop começou a privilegiar outros sons, outras batidas, outras pulsações.

Soul indie
Que agradável surpresa é este Childhood, que pingou na rede com Universal High. Putz, lá vem o cara com essas bandecas que ninguém conhece e menos gente ainda vai gostar, pensa a audiência qualificada. O hoje quinteto surgiu na Inglaterra como uma dupla, estreou em 2012 e agora chega ao segundo disco cheio de amor para dar. Quem tiver boa vontade e ouvir vai descobrir um grupo que parte do soul para cunhar delicinhas pop – tipo um Lenny Kravitz indie, como insinuam “Californian Light”, “Cameo” e a balada retrô “Understanding”.



(coluna publicada hoje no
Diário Catarinense)

20170822

Chico Buarque continua igual, mas nunca o mesmo

Chico participa de manifesto em defesa da democracia. Chico é hostilizado por coxinhas. Chico estreia conta oficial no Instagram. Chico isso, Chico aquilo. Nos últimos anos, Chico Buarque tem aparecido graças às posições políticas que professa (e as consequentes reações que desperta), aos memes que inspira, aos livros que escreve, à cor de seus olhos, a qualquer pretexto. Caravanas, disco inédito a ser lançado na sexta-feira (25), coloca as coisas na devida dimensão: um dos maiores nomes da música brasileira é notícia por causa de um novo álbum, o primeiro desde 2011.



A volta de Chico Buarque ao habitat natural chega precedido pela controvérsia causada pelo single “Tua Cantiga”. O adultério assumido em versos como “largo mulher e filhos e de joelhos vou te seguir” teria um viés machista, desconectado dos anseios da mulher contemporânea. O debate a respeito ajudou a promover o trabalho (como se fosse necessário), arranhou um pouco a imagem de “muso” do artista e relegou a música a segundo plano. Mas limitar Caravanas a discussões sobre a intenção do autor é muito desconhecimento de sua história, desonestidade intelectual ou simples despeito.

As nove faixas não destoam de nada do que Chico Buarque já apresentou ao longo da carreira. Durante cerca de meia hora, desfilam sambas em diversas cadências, boleros, blues; puros ou forjando o gênero que se convencionou chamar de MPB. As eventuais inovações adotadas só consolidam a certeza de que ele continua igual, nunca o mesmo. Das sete canções compostas e registradas em estúdio a partir do final de 2015, pelo menos duas calam fundo logo de cara. Uma, a carioquíssima “As Caravanas”, insinua um funk para retratar um Rio onde “suburbanos tipo muçulmanos do Jacarezinho” apavoram a classe média. Outra, “Casualmente”, tem a pegada latina que a envolve legitimada pela letra em espanhol.



Do baú vem mais um destaque, “Dueto”, com a neta Clara desempenhando o papel que era de Nara Leão na versão original, contida no LP Com Açúcar, com Afeto (1980). Sucessivas audições acabam por revelar também delicadeza e achados poéticos em “Desaforos”, “Massarandupió” ou “Blues para Bia”. Irão se tornar clássicos? Provavelmente, não. No entanto, devem servir para alimentar o culto que cerca tudo o que Chico Buarque faz – até o próximo arremedo de polêmica.

(coluna publicada no Diário Catarinense)

20170808

Otto, de novo tão bom como no tempo do Bob

Por mais invertida e desanimadora que esteja a realidade, tem duas coisas rolando que não deixam a gente desistir do Brasil. Uma é Ottomatopeia, o disco novo de Otto. Lançado sem o fuzuê nem a pretensão dos anteriores, o sexto álbum de inéditas do pernambucano não se perde em elucubrações & afins. Pelo contrário: tanto em forma quanto em conteúdo, pelas 11 faixas emana uma vibração, um frescor, uma leveza que ele parecia ter abandonado no mesmo recôndito onde mofavam os elogios recebidos no começo de carreira.



Apesar da pretensa isenção, a verdade é que gosto de Otto. Se já era difícil não simpatizar com aquele galego maluquete que tocava percussão no Mundo Livre S/A, ficou impossível quando ele estreou solo com Samba pra Burro, em 1998. Além das múltiplas razões musicais para admirá-lo, ganhei uns trocados o entrevistando para a revista Mercado Mundo Mix (extinta) e – o que não se faz para pagar o aluguel – com um texto para o CD que acompanhava a edição da Trip, narrado pelo próprio publisher Paulo Lima.

Dessas ocasiões resultou um vínculo pequeno para ser chamado de amizade, mas suficiente para que nos cumprimentássemos por aí. Como na vez em que o encontrei no supermercado, em pleno carnaval paulistano. A mídia já tinha escolhido Tiazinha (performer sadomasô de algum malfadado programa de Luciano Huck) e o padre Marcelo Rossi (o Fábio de Melo de então) como as estrelas da folia. Ambos estampavam todas as capas de revistas na fila do caixa. Apontei para Otto a contradição entre o chicote e a batina.

— Mas isso é a cara do brasileiro: o cristão de pau duro! — respondeu ele, conquistando um fã para sempre.



O figura me sai com uma pérola de sabedoria desse quilate, depois engata um romance com Alessandra Negrini e eu agora vou ficar falando que a música dele é assim ou assado? De jeito nenhum! Ouvi Ottomatopeia como torcedor. Não foi esforço nenhum, principalmente se comparado à fossa suprema de Certa Manhã Acordei de Sonhos Intranquilos (2009) ou à barafunda de conceitos e ideias de seu último trabalho, The Moon 1111 (2012). O pop domina, travestido de rock, brega, latinagens e nordestices.

Ensaiei cair na umbigada com “Bala” e “Teorema”, suspirei com “Carinhosa”, decorei “É Certo o Amor Imaginar?” e “Caminho do Sol”. Desconfiei que fosse Roberta Miranda em “Meu Dengo” (confirmada), refleti em “Soprei”, repeti “Atrás de Você”. Independentemente do que você ache, não dá para negar que Otto se entrega em cada música. Em tempos de indiferença, ele investe na paixão. Ah: a outra coisa que não deixa a gente desistir do Brasil é que, a despeito de todos os descalabros, as instituições continuam funcionando.


 
(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170713

O que é música comercial: entenda

No país onde a definição de escândalo precisa de atualizações diárias, quase ninguém se importou com o surgimento da “banda institucional” de uma grife carioca. Para quem está por fora, a tal confecção feminina contratou um grupo – na verdade, uma dupla chamada Flor de Sal – para a representar na música. Antes de gravar, os integrantes receberam orientações do marketing da companhia sobre temas e influências, incluindo uma lista de palavras que traduziriam o lifestyle da marca. Daí resultou um disco com 10 faixas, lançado nos serviços de streaming pelo selo da própria cliente.



Hmmm, interessante. Possíveis reações: um, o público ouve sem saber do que se trata e se sente enganado ao descobrir; dois, o público sabe do que se trata e nem ouve. Em ambas, os responsáveis pela estratégia desprezam uma condição elementar para que a experiência funcione: quando é música que se procura, é música que se deve ouvir, não propaganda. Talvez fosse muito mais eficaz a grife pagar alguma artista com o qual se identifique para associar sua marca a ela. Ou simplesmente vesti-la, uma parceria simpática às claras e sem maiores consequências se velada.

Não é propaganda, é branding, dizem especialistas. Beleza. Música e publicidade sempre andaram juntas mesmo. Via patrocínio. Nos jingles. Em canções vendidas para campanhas. Tudo isso é conhecido e aceito, jogo jogado. Mas a zona cinzenta entre uma e outra tem que ser acessada com muito tato para corresponder. O tosco merchandising em letras desfila elegância ímpar perto da adoção de uma espécie de banda customizada para transformar branded content em música. Ninguém quer que ninguém ganhe dinheiro com o talento que tem, seria injusto demais. A gente só acha que, assim como um tanto de integridade, um pouco de cinismo é fundamental.

***

Ah, é. Parabéns, rock.


E por falar em exposição na mídia
Vitrine das boas para a cultura pop em Florianópolis: o sagaz Marcelo Siqueira está com um programa pautado pela música, artes plásticas, cinema, fotografia e demais reinações criativo-comportamentais que brotam do fértil solo local ou aportam na ilha. O negócio atende pelo nome de Emenda, é atualizado toda semana e já chegou à quinta edição. Na terceira, por exemplo, há uma entrevista com o ex-vocalista do Dazaranha, Gazu, que é reveladora pelo que não diz. Em vez de ficar batendo na surrada tecla de por que ele saiu da banda, a conversa gira em torno do presente e do futuro.




 ANÇAMENT
OS


Don L, Roteiro para Aïnouz Vol. 3 – O primeiro (apesar do número) volume da trilogia prometida pelo rapper cearense esbanja letras espertas, calcadas no vocabulário da juventude conectada, e batidas que fogem do lugar comum. O cara é bom, mas falta o hit, como foi “Chapei” no ano passado.



Haim, Something to Tell You – O trio de irmãs californianas goza de uma moral entre certa parcela do circuito hipster que é difícil de entender. No segundo disco predomina um pop radiofônico que, quando dá liga, lembra Sheryl Crow. A mais, senão única, faixa convincente é “You Never Knew”.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170705

5 discos para lembrar (ou esquecer) da primeira metade deste ano



Como já é tradição, a passagem da primeira metade do ano impõe um balanço do que de bom, de feio, de sujo e de malvado saiu até agora. Quem desponta como favorito para a lista final, quem queimou a largada, quem será ainda lembrado em dezembro é coisa para se preocupar somente se por algum acaso as instituições deixem de funcionar. Por ora, o que importa é sublimar a apatia reinante e saudar a batida contagiante, o refrão afiado, a combinação de notas e timbres que parece já ter sido feita antes, de tão azeitada. Abaixo, cinco exemplos (em ordem alfabética) de discos que se enquadraram nesses parâmetros. Não, não esculache a lista: faça a sua e seja feliz.



Bike, Em Busca da Viagem Eterna | Expoente da renascença psicodélica brasileira, o quarteto paulistano flana bonito no segundo disco. Sol, grão de poeira, brisa, sonho profundo, fumaça roxa, essência, paz celestial, mar, portas da percepção, sapos flamejantes, montanha sagrada e estrelas formam a paisagem do caminho transcendental percorrido pelo ciclista cósmico. O destino é incerto, mas nem tão longe assim. A atmosfera densa é que deixa os movimentos mais lentos. OUÇA “Do Caos ao Cosmos”, “A Divina Máquina Voadora”, “O Retorno de Saturno”.



Curumin, Boca | O quarto álbum do baterista faz-tudo tem conceito, esbanja modernidade, investe em experimentações e talz. Bem da hora. Mas é ao assumir a (inegável) vocação pop já mostrada em 2011 com “Compacto” que o negócio fica facílimo de digerir. O samba pode ser torto; a bossa nova; errada; o reggae; enviesado: quando o refrão pega e o groove flui gostoso, a brisa refresca da cabeça ao baixo ventre, sem escalas. Tão brasileiro, tão universal, como manda a cartilha contemporânea. OUÇA “Terrível”, “Boca Cheia”, “Prata, Ferro, Barro”.



Dan Auerbach, Waiting on a Song | Faz tempo que a metade mais reluzente do Black Keys atingiu um estágio de regularidade que garante no mínimo nota 7 para sua música. Se estiver muito inspirado, porém, é grande a chance de o nível chegar à excelência. A segunda incursão solo do cidadão segue esse padrão. Nas faixas menos brilhantes, desfila como um bailinho retrô. Nos momentos em que recebe a visita das musas, enternece com doçura e atiça com picância. OUÇA “King of a One Horse Town”, “Never in My Wildest Dream”, “Cherrybomb”.



Jesus and Mary Chain, Damage and Joy | Dezenove anos se passaram sem disco novo dos irmãos Jim e William Reid. Neste período, o rock se perdeu, o rap fez fortuna, a eletrônica virou axé. E ninguém superou – ou se interessou em superar – a manha dos manos escoceses em conjugar barulho com melodia. A surpresa é que eles voltaram mais alegres, com uma euforia quase adolescente. Mesmo soando meio datado, ainda exala um frescor capaz de seduzir novas gerações que não estão paradinhas. OUÇA “Amputation”, “All Things Pass”, “Always Sad”.



Sleaford Mods, English Tapas | Que bom que, em meio à afetação generalizada, sempre aparece um bando de desajustados fingindo-se de burros para desvirtuar um ou outro jovem sonhador. No caso, dois ingleses cheios de sotaque e inconformismo, como uma versão reduzida e atualizada dos Sex Pistols. A música é simples, direta, despida de quaisquer adereços que atenuem o nobre propósito de dar uma chacoalhada na apatia reinante. Ou apenas aloprar. O (dedo do) meio é a mensagem. OUÇA “B.H.S.”, “Just Like We Do”, “Moptop”.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170628

Podes crer, amizade: livro revive movimento Black Rio

Bem-vindo ao Brasil da década de 1970. Um país onde reina a igualdade, desde que sua pele seja da cor adequada. Impera a liberdade, desde que não ameace a soberania nacional. Abunda a fraternidade, desde que você saiba o seu lugar. Foi neste contexto de instituições em pleno funcionamento que dos subúrbios cariocas emergiu uma cultura musical para dar voz, visibilidade e afirmação à juventude negra. A história é recuperada agora com passos coreografados, gírias e muito ritmo pelo livro 1976 – Movimento Black Rio, de Luiz Felipe de Lima Peixoto e Zé Octávio Sebadelhe.



Em 17 de julho daquele ano, uma reportagem assinada por Lena Frias no Jornal do Brasil descreveu a onda que bombava em mais de 300 bailes periferia adentro. Sem querer, o título da matéria acabou batizando o fenômeno, que já existia havia pelo menos cinco anos e até então não tinha nome nem se organizava como movimento: “Black Rio, o orgulho (importado) de ser negro no Brasil”. Em quatro páginas, a zona sul era apresentada a equipes de som e discotecários despejando funk e soul americanos para pistas lotadas por uma moçada guerreira e esperta.

Furacão 2000, Black Power e Cash Box disputavam o posto de donas da parafernália sonora mais potente. Mister Funky Santos, Ademir Lemos e Big Boy competiam para ver quem rolava os maiores sucessos do momento nas carrapetas. Gerson King Combo, Carlos Dafé e Banda Black Rio pediam passagem com trabalhos autorais. E, acima de tudo e de todos, pairava Tim Maia, representante-mor do groove gringo adaptado para a realidade local. De repente, a MPB descobria que “negro é lindo” e absorvia as influências. O cidadão de bem ligava a televisão e se deparava com um balanço diferente na trilha da novela.



Em uma época de ânimos acirrados e polaridade latente, a exposição dos brothers na mídia incomodava geral. A direita temia pela radicalização da luta contra o racismo. A esquerda reagia contra o que considerava um desprezo ao samba como legítima música dos despossuídos. O futuro próximo desmoralizaria ambos os lados. O movimento não morreria; iria se dispersar por diversos estilos. Um deles seria o funk carioca que pariu Anitta, hoje invadindo as paradas dos Estados Unidos. Não deixa de ser uma justiça poética para um movimento acusado de somente copiar o que vinha de fora.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170620

Mallu Mulher

Mallu Magalhães teve que se mudar para a outra margem do Atlântico para fazer seu disco mais brasileiro. No quarto trabalho solo, Vem, a paulistana radicada em Lisboa há quatro anos larga o folk com que despontou em 2007 e abraça ritmos nacionais. Conforme a relação do freguês com a obra da autora, a sonoridade dominante no repertório é digerida como demonstração inconteste de maturidade artística e pessoal ou simplesmente uma guinada sem volta rumo à MPB “universitária”. Ambas as percepções se justificam.



A polêmica em torno do clipe de “Você Não Presta”, acusado de explorar dançarinos negros, colocou em segundo plano a excelência instrumental do álbum. Com produção do consorte Marcelo Camelo e arranjos do craque Mario Adnet, os timbres certos nos lugares certos com a potência certa realçam o frescor retrô de canções como “Culpa do Amor” ou “Pelo Telefone”. Uma suavidade que irriga a sensação de que tudo é diminutivo demais: o samba vira sambinha; a bossa, bossinha; borrando a fronteira entre delicadeza e diluição.

Melhor sorte têm as músicas que não representam a essência do disco. As desbragadas “Será que um Dia” e “Navegador” seriam quase bregas, não fosse Mallu o suprassumo da fineza. “Love You”, a única em inglês, lembra a musa indie de uma nota só que ela não quis se tornar. E os toques de fado de “Linha Verde” remetem à cidade onde mora. Aos 24 anos, mãe de Luísa, 2, a mocinha que surgiu ainda adolescente cantando “Tchubaruba” tornou-se uma “gata da vida”, como se define em São Paulo. Agora é que vai ficar bom.

Solo da chave-mestra
Um disco solo de um cara que lidera uma banda com somente mais um componente? E o segundo, já?! Pois é. Para quê? Aí vale aquele clichê: em Waiting on a Song, Dan Auerbach dá vazão a abordagens que não acha conveniente – afinal, ele manda – adotar em seu grupo-matriz, o Black Keys. A saber, uma pegada que descamba para o bailinho sessentista, mas engrena mesmo quando avança pelo velho oeste (“King of a One Horse Town”), encarna um Jack Johnson rural (“Never in My Wildest Dreams”) ou apela para a sexy “Cherrybomb”.




 ANÇAMENT
OS



Boogarins, Lá Vem a Morte – Os goianos lisérgicos disseram que se inspiraram muito em artistas experimentais como Flying Lotus no sucessor do aclamado Manual (2015). De fato, prevalecem programações eletrônicas, colagens e efeitos diversos. No meio de tanto conceito, brilha “Onda Negra”, careta como uma boa canção.



Snoop Dogg, Neva Left – Nada contra fazer um álbum que expressasse as várias fases da carreira, como o rapper anunciou. O problema é que em sua trajetória não faltam exercícios de autoindulgência, pilhas erradas ou só preguiça mesmo. Ainda bem que “Go On” evoca o groove de seu último grande trabalho, Bush (2015).



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170607

Você coloca e o mundo fica malucão, diferente do que é

Tudo bem, o brasileiro sempre gostou de psicodelia na música. Basta notar a quantidade de drogas nas paradas de sucesso, hahaha. Sério, de uns tempos para cá bandas que propõem percepções extrassensoriais tem brotado na cena nacional como cogumelos em ambiente úmido e quente. O mais novo fruto desse jardim caleidoscópico chama-se My Magical Glowing Lens, que está estreando em disco com Cosmos. O barato chega neste sábado (10) a Florianópolis, onde os capixabas se apresentam como uma das atrações do 2º Festival Saravá de Cultura Independente.

— Identifico a psicodelia como o movimento da música que luta por igualdade, por uma elevação da alma. Quem faz quer adentrar em algumas coisas que a gente esqueceu, que não entra mais porque fica muito na superficialidade — descreve via celular a guitarrista e vocalista Gabriela Deptulski, uma filósofa que trocou a academia por acordes e versos.



A moça de 28 anos criou o My Magical Glowing Lens após ouvir Tame Impala, os australianos que ajudaram a reconverter a lisergia sonora em tendência. No caso, houve ainda uma razão de ordem prática: se Kevin Parker conseguia fazer aquilo tudo sozinho, ela também poderia tentar. Com microfone de notebook mesmo, começou a gravar. Primeiro bateria, depois guitarras, voz e baixo. A ideia era “criar música para quem gosta de buscar algo além da matéria, um aparato que instigasse esse tipo de pensamento, de libertação”. Daí as tais “brilhantes lentes mágicas” do nome.

— Você coloca e o mundo fica malucão, diferente do que é.

De fato, o incauto viajante põe Cosmos para rolar e se impressiona. As 11 faixas se desenrolam mais fluidas e densas do que as quatro contidas no EP que Gabriela soltou em 2013, quando ainda tinha somente seus insights como companhia e o inglês como idioma das letras. A incorporação de um baixista, um baterista e um tecladista a deixou solta para se aprofundar nos climões que embalam “Sideral”, “Raio de Sol” ou “Tente Entender”. Lá pelo finalzinho, “Supernova” até ensaia dar uma aloprada, mas o tom geral é de transe e bonomia, sem chance para bad trips.

— Não sei nem aonde quero ir, quanto mais aonde chegar. Vamos continuar fazendo música da forma mais bonita, mais sincera possível. A música é muito transformadora nesse sentido, de fazer a gente enxergar coisas que não veria de outro jeito — afirma.

O discurso seria pertinente em qualquer situação, mas torna-se mais oportuno diante do obscurantismo medieval vigente. Junto com expoentes como Boogarins, Supercordas, Tagore ou Bike, o My Magical Glowing Lens se alinha ao bloco de artistas que, entre a descrença e a alienação, adota um caminho que, “querendo ou não, é uma forma de protesto, mesmo não tendo letras políticas”. Ou, como acredita a musicista, “quando você fala de liberdade, já está protestando contra algo que lhe foi imposto”.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170531

Dois brasileiros que não desistem nunca

Depois de muita onda e pouco caldo, o Brasil-il-il volta a impor presença na playlist de 2017. E com dois discos de uma vez, sinal inequívoco de que as instituições estão funcionando. Um é Galanga Livre, de Rincon Sapiência. Outro é Boca, de Curumin. Ambos de São Paulo, relativamente conhecidos – somente e olhe lá – pelo nicho que se informa sobre música. Aqui mesmo no jornal, lugar de gente jovem & conectada, seus nomes despertam reações desencontradas. “Curumin apareceu como dica para mim no Spotify, vale?”, consulta uma colega. “Rincon Sapiência, massa”, confirma outra.



Danilo Albert Ambrosio, o Rincon Sapiência, está no radar pelo menos desde 2010, quando despontou com “Elegância”. Daí em diante, assinou com o selo do produtor Rick Bonadio, faturou algum (é o que se espera) estrelando comercial da Caixa e, entre um corre e outro, ia soltando suas rimas a conta-gotas. Afastou-se do profissional que revelou Mamonas Assassinas, Charlie Brown Jr. e NX Zero sem lançar o aguardado disco cheio, com uma pá de faixas para a moçada. Só agora, dirigido por William Magalhães (Banda Black Rio), ele estreia com um álbum completo para chamar de seu.

A lenda do nobre africano Galanga, tornado Chico Rei depois de capturado e vendido como escravo, abre a contenda via “Crime Bárbaro”. A impressão é de que o dedo na cara vai imperar, até o groove tomar conta em “A Volta pra Casa”. Tem espaço inclusive para romantismo, embalado por “A Noite É Nossa” e “Amores às Escuras”. Somadas a singles que já vagavam por aí, como “A Coisa Tá Preta” (uma das melhores do ano passado) e “Ponta de Lança”, perfazem um disquinho bastante palatável, em que a maior virtude – não se limitar à ladainha monocórdia – é também a maior fraqueza: como cantor, o rapper fica devendo.



Luciano Nakata Albuquerque, o Curumin, surgiu em 2005 atirando para diversas direções. A sonoridade contemporânea movida a samba torto, bossa nova errada e reggae de bamba de seus três trabalhos anteriores lhe renderam elogios da crítica e brodagens na gringa. Em um mundo menos imperfeito, teria ficado mais popular a partir de 2011 com “Compacto”. Do hit que não vingou ao estágio atual, pouca coisa se alterou. Continua não havendo nenhuma razão concreta para ele acreditar que desta vez será diferente, apesar da inegável vocação pop soterrada pelo conceito de sua nova empreitada.

Para descobri-la de graça, é necessário superar uma série de incursões que desmontam o formato canção, tão modernas quanto impenetráveis – andar demais com Ava Rocha, que ainda assina a capa, dá nisso. Felizmente, o baterista faz-tudo acerta a mão nas jamaicanas “Boca de Groselha” e “Prata, Ferro, Barro”, mantém a vibração lá no alto em “Terrível” e atinge o baixo ventre com precisão em “Boca Cheia”. Pesando tudo na balança, é grande a probabilidade de eu chegar a dezembro tendo ouvido bem mais Curumin do que Rincon Sapiência. Mas isso não é uma competição, né? E eu adoro minhas colegas.

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170527

Os discos que ficaram órfãos sem Kid Vinil

Nos obituários escritos em memória a Kid Vinil, não raro o artista falecido há uma semana foi descrito como “uma pessoa muito doce”. Não era elogio para dourar a biografia de quem já transcendeu este plano. Na meia dúzia de vezes em que estive com ele, a gentileza e a ternura que demonstrou foram muito maiores do que seu vasto conhecimento musical. Uma delas foi em 2000, para ouvi-lo falar de seus discos. Como uma forma de homenageá-lo, segue abaixo o resultado do encontro, publicado na seção Minha Coleção da extinta – e, circunstancialmente, saudosa – revista Bizz de junho daquele ano. Esteja onde estiver, nunca deixe o bolachão parar de rodar, Kid.



Disco é apelido

Da porta da sala do apartamento dá para ver seis torres giratórias, com capacidade para uns 500 CDs cada. Em volta, estantes por toda a parte, abarrotadas de vinis. Para onde se olha, estão prateleiras e mais prateleiras com discos. Num canto, o espaço das caixas especiais, dos mais variados artistas, tamanhos e formas. A riqueza de detalhes da paisagem fonográfica é tanta que torna ridículo qualquer trocadilho com a coleção de um sujeito chamado Kid Vinil. O cara tem disco que não acaba mais. “Uns 10 mil LPs dos anos 1960 e 1970 na casa dos meus pais, 5 mil aqui e 6 mil CDs”, calcula o feliz proprietário, que organiza o acervo de um jeito todo particular. “Não tem ordem nenhuma, mas acho o que quero em segundos”, garante.

Como que para provar o que disse, Kid pega de uma estante o compacto de “Magical Mistery Tour”, dos Beatles. “O primeiro disco que comprei, aos 12 anos. Fui com meu irmão aos filmes Os Reis Do Ie-Ie-Iê e Submarino Amarelo e fiquei fascinado pela banda”, conta o apresentador do programa Lado B, na MTV. Na época, 1967, dinheiro para música era artigo escasso no orçamento da sua família. Para poder gastar com rock, ele precisava ser, digamos, criativo. “Torrava a grana do passe escolar”, diverte-se.

Mais tarde, o garoto que ainda atendia por Antonio Carlos Senefonte descolou um jeito melhor de obter os álbuns cobiçados. “Entrou um português na minha classe e apresentou Rolling Stones e Jimi Hendrix para todo mundo”, lembra. “Aí eu pegava os discos dele emprestados e não devolvia”, diz, levantando-se e voltando com a cópia do Beggar’s Banquet [dos Stones] na mão, para confessar em seguida: “Era dele”.

De jovem sem condições para comprar discos a esse maníaco que hoje acrescenta “uns 20 CDs e uns dez vinis” por mês à coleção, o caminho percorrido foi longo. Começou na seção de recursos humanos da gravadora Continental. “Um dia, o presidente da companhia estava atrás de uma música do Seals & Crofts, ‘Fresh Freaks’, que rolava na rádio e ninguém sabia de quem era. Como conhecia a canção, fui promovido para o departamento artístico”, conta. Seu acervo, já com mil títulos, ganhava a oportunidade de rápida ampliação.

Em 1977, a empolgação de Kid – então fã de rock progressivo – com a música dava sinais de cansaço. O punk o salvou. “Meu irmão que não deixou, senão eu ia trocar meus álbuns pelos lançamentos que chegavam na Wop Bop, a loja onde achei God Save The Queen, dos Sex Pistols.” Ao mesmo tempo, pintou também a new wave americana. Assim, no programa que manteve de 1979 a 1981, na rádio Excelsior, ele (estreando o apelido, óbvio para um tarado por discos) mandava “Blitzkrieg Bop”, dos Ramones, e “Psycho Killer”, dos Talking Heads.

A estas alturas, Kid recebia álbuns de todo mundo e comprava outros tantos. Mas nada que se comparou à fartura proporcionada pelo estouro de “Sou Boy”, em 1983. A bordo da banda Magazine, ele torrava o cachê dos shows em viagens para procurar mais discos. “Ia quatro vezes por ano para Londres e Nova York buscar coisas do Devo, Runaways, The Dickies…”, enumera. Com o fim do grupo, em 1987, Kid voltou para o rádio e iniciou na TV Cultura, nos programas Boca Livre e Som Pop, até 1993. Daí em diante, retornou às gravadoras, primeiro na Eldorado e atualmente na Trama.

Agora, imagine quantas vezes ele já não escutou a piadinha: “Ei, quando é que você vai mudar seu nome para CD?”. Na verdade, Kid resistiu ao laser. "Conheci em 1987, na Alemanha, mas só comprei um aparelho em 1992, porque ganhei uma caixa de singles dos Stones”, afirma. “Da década de 1990, por exemplo, muitas bandas só tenho em vinil”, diz, puxando LPs do Primal Scream, Happy Mondays e Inspiral Carpets. “Mesmo assim, devo ter uns mil discos nos dois formatos. Sou fã dos grafismos, das capas, da arte que se perde com o CD.”

Kid vai ilustrando suas predileções com uma infinidade de picture discs, tiragens limitadas, capas com dobras malucas. No meio de tantas opções, reconhece que os mais tocados são Dead Boys, New York Dolls e Blondie. “Não me canso de ouvi”, conta ele, que teve seu primeiro contato com a música pop aos sete anos, por intermédio de uma tia fã de Elvis Presley. Aliás, na estante de cima estão três caixas do Rei do Rock, lacradíssimas. “Não tive tempo de abrir”, alega, enquanto aponta para outras caixas igualmente virgens. Mas, só de poder sentar no sofá e contemplar cada item de sua coleção, Kid já está satisfeito.

Prateleira especial

Faces | A Nod Is as Good as a Wink
“Meu guru na época, 1971/72, o jornalista Ezequiel Neves, escreveu loucuras sobre a banda. Foi uma abertura para outros sons. E as pegadas de guitarra de Ron Wood me enlouqueciam. Com o piano boogie, então, era um casamento perfeito.”



Dead Boys | We Have Come for Your Children
“Eu tinha um programa de punk na rádio Excelsior e rolava essas coisas todas. Esse disco me chamou a atenção porque eles fizeram uma versão fantástica de ‘Tell Me’, dos Stones. Até hoje, é uma das minhas bandas prediletas.”



Chicago | VI
“Eles faziam uma fusão de jazz e rock com sabor pop que marcou minha adolescência. E eu sempre gostei da parte gráfica dos discos deles, adorava o jeito que eles exploravam o logotipo da banda. Esse é em papel-moeda, mas tem imitando ferro, chocolate, madeira…”



Raspberries | Side 3
“Minha cópia é importada, mas saiu no Brasil na mesma época (1973) pela EMI, com essa capa recortada e tudo. É uma das bíblias indispensáveis para se entender o power pop. É a banda do Eric Carmen, que depois virou um bregão.”



Streets (coletânea)
“Traz uma banda chamada Nose Bleeds, com Morrissey [Smiths] nos vocais e Billy Duffy [The Cult] e Vinny Reilly [Durutti Column] nas guitarras. Nunca saiu em CD, paguei 60 dólares em uma loja em Los Angeles. Na Inglaterra, não se acha ele por menos de 300 libras.”



Elephant’s Memory | Elephant’s Memory
“Era uma banda que chegou a acompanhar John Lennon, antes da Plastic Ono Band – inclusive o primeiro disco deles foi produzido por John e Yoko. Este é o segundo trabalho do grupo, regado a psicodelia total. Basta dar uma conferida na capa.”



(coluna publicada ontem no Diário Catarinense)

20170520

Chegou o Método Psicoafetivo de Pontuação de Discos©

As instituições continuam funcionando. Isso significa que você pode se preocupar com coisas que realmente importam – como a sua coleção de discos, cada vez mais obsoleta. O já consagrado “advento da internet” fez com que as pessoas trocassem a mídia física por arquivos e, na sequência, pelo streaming. Aquele montaréu de CDs tornou-se um entulho desnecessário, que só denuncia a idade de seu proprietário. Por mais que tenha sido conquistado com tanto esforço, cuidado com tanto carinho e exibido com tanto orgulho, é chegada a hora do desapego.

Mas como selecionar o que fica e o que vai embora?



Seus problemas acabaram! O revolucionário Método Psicoafetivo de Pontuação de Discos© estabelece critérios simples e objetivos para separar as obras que você deve manter das que devem ser dispensadas. Primeiro, defina quantos discos pretende descartar. Em seguida, submeta seu acervo às condições abaixo:

– Se é um clássico: 10
– Se você tem o disco há mais de dois anos e nunca o ouviu: -10
– Se você nunca ouviu o disco inteiro: -5
– Se você já ouviu o disco inteiro mais de uma vez: 1
– Se você já ouviu o disco inteiro mais de 10 vezes: 10
– Se tem dedicatória: 2
– Se é autografado: 2
– Se o autor tornou-se mais conhecido depois que encerrou a carreira/morreu: -5
– Se o autor voltou à ativa depois de ter encerrado a carreira: -10
– Se você já tiver outro disco do autor: 1
– Se você já tiver mais de dois discos do autor: 3
– Se você conhece o autor pessoalmente e gosta dele: 5
– Se você conhece o autor pessoalmente e não gosta dele: -5
– Se você não só conhece o autor, como ele é seu amigo e visita sua casa com frequência: 20
– Se depois de ouvi-lo você comprou outro exemplar para dar de presente: 3
– Se ganhou de presente: 1
– Se ganhou de um ex-namorado ou ex-namorada que deixou boas lembranças: 5
– Se ganhou de um ex-namorado ou ex-namorada que deixou más lembranças: o que você ainda está fazendo com essa p* de disco?
– Se emprestou o disco, não devolveram e você comprou outro: 8
– Se emprestou de novo, não devolveram de novo e você comprou outro de novo: -5

Agora basta somar os pontos. Os discos com a menor pontuação serão descartados, até atingir a quantidade que você estipulou para se livrar, deixando assim espaço de sobra para o acúmulo de novas tralhas. Dica: todos os discos que tiverem pontuação negativa não merecem um lugar na sua prateleira e no seu coração. O método vale também para arquivos. Não, não precisa agradecer. A gente está aqui para isso.

***


Nunca saberemos o que leva um artista talentoso, idolatrado e bonito como Chris Cornell a, conforme apontam as investigações, tirar a própria vida. Fica o vozeirão que embalou uma geração com “Outshined”, a “Born to Be Wild” dos anos 1990.



(coluna publicada ontem no Diário Catarinense)

20170512

Às mães do pop e até àquelas que não gostam de música

O pai do rock, ensinou Raul Seixas, é o diabo. E a mãe, quem seria? Segundo a Wikipédia, o título vai para Rosetta Tharpe, uma cantora e guitarrista negra que sacudiu os Estados Unidos na década de 1940. Casada com um pastor pentecostal, sua música abalou os dogmas da igreja, mas arrebanhou uma legião de fãs ilustres – entre os quais Elvis Presley, Chuck Berry, Jerry Lee Lewis, Johnny Cash e Little Richard, todos convertidos pela energia da sista. Daí ser atribuída a ela a maternidade do ritmo bastardo.



Em homenagem às mães do rock & demais gêneros que compõem o pop (e até àquelas que não gostam de música, se é que existem), veja abaixo uma lista de músicas que, de forma direta ou enviesada, são dedicadas a elas:

“That’s Allright Mama”, Elvis Presley | Primeiro single do rei, apenas. O que ele não imaginava é como tudo ia ficar muito melhor depois do lançamento da versão endiabrada de um blues de Arthur Crudup, em 1954. Em 7 de julho daquele ano, o DJ Dewey Phillips a tocou na rádio. O resto é aquela história.



“Mamãe Coragem”, Gal Costa | Miudeza escondida no meio dos clássicos do disco-manifesto Tropicália, traz a baiana defendendo a letra de Caetano Veloso e Torquato Neto. Se fosse escrita hoje, talvez sugerisse o celular como antídoto para a saudade. Pode dormir tranquila, está tudo bem.



 “Mother”, John Lennon | Acompanhado por Ringo na bateria e Klaus Voorman (autor da capa do do disco Revolver) no baixo, o ex-beatle abre o primeiro disco solo falando da mãe (“você me teve, mas eu nunca tive você”) e do pai (“você me deixou, mas eu nunca te deixei”). Pela infância que teve, bota autobiográfico nisso.



 “Mande um Abraço pra Velha”, Mutantes | A saudação devia ser endereçada ao que a banda costumava ser até 1972. Foi a última gravação de Rita Lee com o grupo. Dali para frente, sem ela e com Arnaldo Baptista meio desligado, Sergio Dias assume o leme criativo e o frescor descamba para o progressivo.



 “Ave Maria da Rua”, Raul Seixas | Quem vê o maluco beleza simplesmente pelo lado místico-folclórico não sabe o que está perdendo. Sem compromisso com bandeira nenhuma, o baiano abriu o coração para louvar aquela que está “no lixo dos quintais, no amor dos carnavais, no tapa e no perdão, no ódio e na oração”.



“Mother”, Pink Floyd | Como se não bastasse a perda do pai na guerra e o bullying na escola, o atormentado protagonista de The Wall ainda tem que lidar com uma mãe superprotetora. Para a senhorinha em questão, o filho nunca poderá voar, mas ela pode deixá-lo cantar. Resumindo, será sempre um bebê.



“Só as Mães São Felizes”, Cazuza | Certamente muitas das situações listadas foram experimentadas pelo cantor. Certamente também muitas foram inventadas só para infernizar a mãe. A reação de Lucinha Araújo, depois de enterrar o filho, foi a mais carinhosa possível: batizou o livro sobre ele com o nome da música.



“Mãe”, Emicida | Tirando Eminem, está para nascer o rapper que não louve a mãe. Não é diferente entre os manos que rimam em português. O contexto se repete: guerreira, abandonada pelo pai da criança, se desdobrando para o moleque não cair em pilha errada. Aí o cara cresce e vira artista. Valeu a pena.



 “Nem Mãe nem Puta”, Kleyderman | O projeto paralelo dos titãs Branco Mello e Sérgio Britto (mais a baterista Roberta Parisi) teve vida curta nos anos 1990, mas deixou como legado esta obra-prima de concisão em homenagem não somente às progenitoras, como às loucas mais amadas do mundo.



“Coração de Luto”, Teixeirinha | O gaúcho “coração do Rio Grande” fez o Brasil chorar com o relato em milonga & versos da ardente tragédia ocorrida com dona Liduina quando ele tinha nove anos. Só os críticos não ficaram comovidos, dando à canção o cruel apelido de “churrasquinho de mãe”.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170502

Rapper inovador vira sambista tradicional

Lá vem Criolo com seus lararás. Amante assumido de samba, o rapper paulistano lançou na última sexta-feira um disco inteiro devotado ao estilo. Espiral de Ilusão vem acompanhado por uma revista com uma entrevista com ele, as cifras e as letras das dez faixas, todas inéditas – o pacote (MP3s e PDF) está disponível para download gratuito no site do artista. Durante pouco mais de meia hora, o rimador que quebrou barreiras no hip hop nacional se torna o cantor reverente aos bambas do gênero. Sai a inovação, entra a tradição.



O tipo de samba que Criolo apresenta agora é da mesma linhagem que já tinha aparecido em amostras como “Linha de Frente” (do álbum Nó na Orelha, em 2011) e “Fermento pra Massa” (de Convoque seu Buda, em 2014): puro, movido apenas a cavaquinho, violão de sete cordas, percussão, sopros e coros, sem procurar nenhuma batida perfeita resultante de uma eventual mistura com rap. As variações ocorrem dentro do próprio universo do ritmo, na cadência de vertentes que vão do fundo de quintal ao recôncavo baiano.

Exceto nas politizadas “Menino Mimado” e “Cria de Favela”, os versos relatam situações cotidianas com mais cara de presepadas do que de denúncias e, principalmente, sofrem por desamores. Mas ainda é difícil associar o sambista Criolo ao dengo de Martinho da Vila (“Lá Vem Você”), ao lirismo de Paulinho da Viola (“Dilúvio da Solidão”) ou à malandragem de Moreira da Silva (“Filha do Maneco”) sem forçar alguma barra. “O samba não é quando você quer, é quando seu coração está preparado”, diz ele. Resta saber se os fãs também estão.

Delícias do campo
A pacata São Pedro de Alcântara, na Grande Florianópolis, vai mais uma vez estremecer com o Rural Rock Fest. O festival, que estava em estado de animação suspensa desde 2008, desperta de 12 a 14 de maio com uma série de atrações (em ordem alfabética, para evitar ciumeira): Alkanza, Apicultores Clandestinos, Babba, Blame, Burn, Circo Quebra Copos, Da Caverna, Eutha, Five Boys, Katts, Leite de Velha, Napkin, Ninguém Sabe, Os Costeletas, Os Indirigíveis, Parafuso Silvestre, Tumor do Bile, Reus, Rock Roach, Skrotes, The Dolls e Zoidz. Os ingressos estão à venda na Roots Records, no Centro Comercial ARS, na Capital, por R$ 30 e R$ 40 (na hora será R$ 50). Para mais informações – como local, por exemplo –, procure por Vinicius Zimmerman (Vina da Caverna) nas redes sociais. E não esqueça do repelente!




 ANÇAMENT
OS



Gorillaz, Humanz – O quinto álbum do projeto liderado por Damon Albarn (Blur) mostra como nem as bandas virtuais conseguem se livrar maldição do retorno. O que era frescor no início do século virou uma xaropice sem fim, com a (des)vantagem de que ninguém ali é real para se sentir ofendido com as críticas negativas.



Delinquent Habits, It Could Be Round Two – Em 1996, eles despontaram com “Tres Delinquentes”. Sem jamais repetir o sucesso inaugural, o grupo – ainda apadrinhado por Sen Dog (Cypress Hill) – desova uma nova leva de raps com a típica batida da costa leste dos Estados Unidos e uma ou outra rima em spanglish. Fica “Over and Over” como sinal de confiança.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170425

Os ciclistas estão chegando, estão chegando os ciclistas

“Quando as coisas ficam estranhas, os estranhos viram profissionais”
Hunter S. Thompson (1937-2005), jornalista e escritor norte-americano

Que mané Kendrick Lamar o quê! O rapper angeleno que se contente com a aclamação generalizada, porque há experiências inadiáveis se manifestando no Brasil. O disco novo do Bike, por exemplo. Representante da renascença psicodélica nacional, a banda paulistana embarca em uma aventura sem saber onde vai parar, mas aproveitando cada lampejo para expandir a consciência com Em Busca da Viagem Eterna. Os ciclistas estão chegando, estão chegando os ciclistas. Primeiro mais perto, depois mais alto do que o céu.



Além do título do álbum, músicas com nomes como “Do Caos ao Cosmos”, “Psicomagia”, “A Divina Máquina Voadora” ou “O Retorno de Saturno” deixam evidente a dimensão perseguida pelo quarteto. Pelas nove faixas reluz todo o vocabulário – ou, como prefere a realidade linear, clichês – do almanaque extrassensorial: sol, grão de poeira, estrada iluminada, brisa, caminho transcendental, sonho profundo, fumaça roxa, essência, paz celestial, mar, portas da percepção, sapos flamejantes, sonhos e estrelas.

A natureza, o universo, a vida & tudo mais são embalados por uma atmosfera densa, onde o lado escuro da lua é apenas uma escala de uma jornada em que não falta nem a tradicional ponte com o Oriente, erguida em “A Montanha Sagrada”. No lado prático, o arco-íris que se formou com o trabalho de estreia, 1943 (incluído entre os melhores de 2015 por esta coluna, aliás), agora estende-se também por shows na Espanha, Portugal e Inglaterra. O que leva à questão: aqui e alhures, será por acaso a ascensão de grupos como o Bike, que propõem o escapismo?

Tramas sutis
A gente que associa o som do Pará ao tecnobrega precisa rever seus conceitos e conhecer (Leonardo) Pratagy. O segundo disco do rapaz, Búfalo, envereda pelo pop adulto com uma fineza ímpar. Mesmo os esparsos acenos à influência local – como a batida da faixa-título – contribuem para a delicadeza do conjunto. Dos vocais aos timbres das guitarras e dos sintetizadores, o trabalho flui em velocidade de cruzeiro na leveza de “Tramas Sutis”, “De Repente” ou “(Music) Make me Feel”.




 ANÇAMENT
OS



Resistance Radio: The Man in the High Castle Album – Inspirada na série homônima exibida pelo canal HBO e ambientada nos anos 1960, a compilação reúne interpretações de 18 artistas para clássicos da época. Só por trazer “Can’t Help Falling in Love” cantada por Beck e “Love Hurts” pelo Grandaddy já vale a conferida, mas ainda tem “The End of the World” (Sharon van Etten) e “Unchained Melody” (Norah Jones) para dobrar os espíritos mais teimosos.



Laetitia Sadier Source Ensemble, Find me Finding You – Em seu projeto solo, a vocalista do cultuado Stereolab não inventa moda e trafega pelo ambiente seguro já explorado pela banda. “Love Captive” (dueto com Alexis Taylor, do Hot Chip) e “Double Voice, Extra Voice” confortam com texturas retrofuturistas nas quais se identifica bossa nova, lounge music e um vago ar indie, entre outros elementos que proporcionam bem-estar.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170411

Jamiroquai se moderniza avançando para trás

Na capa e no clipe de Automaton, Jay Kay aparece com um chapéu futurista. O adereço predileto do vocalista que... Informação tem prioridade: o Urbana Legion ultrapassou 1 milhão de views no YouTube com o clipe de “Apóstolo São João”. A banda-tributo – adivinhe a quem – é formada por integrantes (atuais ou ex) de Tihuana, Charlie Brown Jr. A letra, inédita, é de Renato Russo. O vídeo foi gravado no apartamento do finado cantor, no Rio de Janeiro. Tudo com o beneplácito do filho do artista, o herdeiro Giuliano. Os fãs adoraram.

Então. O chapéu do vocalista que se confunde com a banda Jamiroquai (vai dizer que você nunca achou que ele fosse o Jamiroquai) não foi a única coisa que mudou no oitavo disco de estúdio dos ingleses. Entre se perpetuar como genérico da inspiração-mor, Stevie Wonder, ou refém do estilo com que ganhou dinheiro, o acid jazz, o grupo encontrou uma terceira via. Como fica manifesto no faixa-título, primeiro single de seu oitavo disco, o baú de referências rejuvenesceu o suficiente para se conectar com o que é considerado moderno.



A recauchutagem turbina também “Superfresh” e “Hot Property”, prontas para ganhar remixes e bombar nas pistas. Para o saudoso daquele Jamiroquai confortável, com um baita bom gosto nos timbres e nas levadas, “Cloud 9”, “Summer Girl” e “Dr. Buzz” cumprem a função. O Daft Punk foi muito lembrado para descrever a atual onda de Jay Kay e trupe. Mas as músicas que realmente marcam se encaixariam bem logo depois de Bruno Mars em uma playlist. Ah: “Apóstolo São João” é emocionante, atual e chata por demais.



(coluna publicada hoje no
Diário Catarinense)

20170404

Depeche Mode e o espírito (de porco) da época

Não satisfeito em levar um soco nas fuças durante uma transmissão ao vivo para a TV, o neonazista americano Richard Spencer aproveitou a repentina e fugaz fama virtual para falar de música. Segundo o assumido apoiador de Donald Trump, o Depeche Mode seria “a banda oficial da direita alternativa”, por conter “elementos fascistas” em letras como a do single Master and Servants, de 1984. A reação do grupo não poderia ser mais contundente: Spirit, um disco que prega o oposto do conservadorismo tão em voga no mundo hodierno.



Claro que as opiniões da supracitada criatura não tiveram influência nenhuma no novo trabalho do agora trio. Surgido na década de 1980, o Depeche Mode sempre empunhou a bandeira da música dançante como principal plataforma política. Mas, ainda que identificado com um gênero considerado fútil – o synthpop, assim chamado pelo farto uso de sintetizadores –, foi estendendo o foco dos quadris até os neurônios. Daí para criticar o estado das coisas em seu 14º álbum, bastou olhar ao redor.



“Estamos indo para trás, rumo a uma mentalidade de homens da caverna”, canta Martin Gahan em “Going Backwards”. Em “Where’s the Revolution”, o alvo é a indiferença geral ante a supressão de direitos, a manipulação e a opressão. Tanto engajamento acaba cansando, é verdade. Como discurso não diverte ninguém, logo surgem “You Move” e “So Much Love” para resolver quaisquer divergências. Quanto a Spencer, a resposta da banda foi lacônica: “He’s a cunt” (expressão tipicamente familiar inglesa que não será traduzida porque esta é uma coluna lida por cidadãos de bem).

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

20170328

Jesus volta e renova a fé na combinação barulho e melodia

A Páscoa é só no próximo dia 16, mas Jesus já ressuscitou. Pelo menos o Jesus and Mary Chain, que está de volta com Damage and Joy. É o tipo de retorno que rende textão – sobre a importância histórica, o legado, o espaço que a banda almeja ocupar no cenário atual. Como ninguém vai ler, basta dizer que fazia 19 anos que os irmãos Jim e William Reid não lançavam trabalho inédito. Na época, eles finalizaram Munki cantando que odiavam o rock’n’roll. No novo disco, terminam dizendo que não se pode pará-lo.



A mudança de opinião dos temperamentais escoceses funciona como parâmetro do que esperar de Damage and Joy. Nem parece que seus autores começaram lá na década de 1980, de tanto frescor que o álbum exala. A combinação afiada de barulho e melodia que arrebanhou fiéis com o seminal Psychocandy (1985) foi preservada. No entanto, como que por intervenção divina, a vocação para a deprê deu lugar a uma euforia adolescente, manifestada logo na abertura com o corinho faceiro de “Amputation”.



O clima continua bom com as grudentas “All Things Pass”, pop até o talo, e “Always Sad”, adoçada pelos vocais da parceira de William, Bernadette Dennin. Ela não é única voz delicada a contrastar com as paredes de guitarras. Isobel Campbell (do Belle & Sebastian) se derrete em “The Two of Us” e “Song for a Secret”, enquanto Sky Ferreira parte corações em “Black and Blues”. Demorou, mas os manos aprenderam o que Vinícius de Moraes sabia desde 1967: é melhor ser alegre do que ser triste.

Talento confirmado 

Pegue o EP dos Noahs, Rise, e mostre para aquele seu amigo indie que paga pau para qualquer bandeca indie folk vinda dos cafundós dos Estados Unidos. Não conte a origem do quarteto, qual a idade dos integrantes, o que já fizeram, nenhuma informação. Apenas bote para rolar. Quando ele estiver totalmente envolvido por “Talk to Me”, de olhinhos apertados com “Colours” ou listando as influências de ‘Suddenly”, comente como quem não quer nada: os rapazes vêm de Florianópolis, estrearam em 2014 com Cedar & Fire e estão cada vez melhores. Em seguida, convide o chapa para o show de lançamento do disco em casa, dia 1º, no Teatro Álvaro de Carvalho (TAC). Não esqueça de avisá-lo para levar o babador.



(coluna publicada hoje no
Diário Catarinense)

20170321

Um disco, 17 bandas, alguma diversão e pouca originalidade

Um bar durar 15 anos surpreende muita gente. Um bar em Florianópolis durar 15 anos surpreende muito mais. Um bar dedicado ao rock em Florianópolis durar 15 anos surpreende surpreende muito mais. Agora, surpreendentemente mesmo é uma estabelecimento voltado a um gênero musical desprezado em uma cidade que prefere sertanejo e eletrônica se manter por tanto tempo e ainda por cima bancar um cedezinho com talentos locais. As surpresas, porém, param no momento em que a coletânea Rock Pub começa a rolar.



A compilação patrocinada pelo Chopp do Gus em 2016 reúne, como é compreensível, 17 nomes com lugar cativo – na prática e/ou no conceito – entre as atrações contratadas pela casa. Ou seja, que partem do estilo formatado pelo recém-falecido Chuck Berry em uma linha evolutiva até chegar aos Rolling Stones, desembocando em Barão Vermelho, TNT e congêneres. Salvo exceções como Skrotes (“Mared Marofa”), não é preciso ser versado em rock para detectar as fontes de Dr. Jorge & Mr. Seben (“Colírios”), The Liras Project (“Baby Você”) ou Ruca (“Marte”).



Quando passam desse ponto, os artistas escalados atingem no máximo o stoner rock, representado pelo KATTS em “Surfing All Around”. Antes de achar demérito nisso, há que se reconhecer a proposta tanto dos participantes do disco quanto do mecenas: a diversão vem na frente de qualquer aspecto novidadeiro que possam oferecer. A própria comemoração do aniversário do Chopp do Gus segue essa linha. Estão programados shows de Metallica, Ramones, Guns‘n Roses, Green Day e outros campeões de audiência. Tudo cover.

Tal banda, tal projeto
As carreiras solo de Julian Casablancas e Albert Hammond Jr. não decolaram. O CRX de Nick Valensi foi pouco ouvido. O Little Joy de Fabrizio Moretti está em estado de animação suspensa. Dos projetos paralelos dos integrantes do Strokes, arrisca o Summer Moon, do baixista Nick Fraiture, ser o mais bem-recebido pelos fãs. Pelo simples fato de a estreia do quarteto, With You Tonight, soar como um disco que a banda-matriz poderia ter feito. Aquele rock nova-iorquino sujinho e dançante, com as influências, timbres e efeitos certos para impressionar indies em geral, dá as caras em “Happenin’”, “Cleopatra”, “Girls on Bikes” e na faixa-título.




 ANÇAMENT
OS



Tennis, Yours Conditionally – O quarto álbum da dupla americana se afasta das pistas acenando com um pop doce e ensolarado. A suavizada valoriza as melodias entoadas pela vocalista Alaina Moore em “My Emotions Are Blinding” ou “Ladies Don’t Play Guitar”, duas das mais brandas amostras de um disco enternecedor.



Lary, Salto 15 – O reclame do EP de estreia da cantora carioca fala em “funk misturado com um pop contagiante” e em “essência e poder de uma voz marcante digna de diva”. Com 20 dias no ar, informa, o clipe da faixa-título conquistou 430 mil visualizações. E você pensando se tratar de mais uma dessas figuras que despontam para o anonimato. Vamos ver até onde chega.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)