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Vapor barato

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(resenha publicada no Diário Catarinense, 30/05/2013)
Na metade de 2012, o rapper Snoop Dogg anunciou que, em uma visita de 35 dias à Jamaica, havia obtido a graça. Ele seria a reencarnação de Bob Marley e, a partir de então, seguiria a religião rastafári, passaria a se chamar Snoop Lion e gravaria reggae. Fãs que já o viram fazer comédia, apresentar talk show, dirigir filme pornô e até emprestar sua voz para GPS pensaram se tratar de mais um papel representado pelo ídolo. Mas o fanfarrão não estava viajando.
O resultado da transformação é Reincarnated, melhor do que qualquer disco de rap que o ex-cachorro tenha lançado ultimamente. No documentário que precedeu o álbum, ele explica como encontrou Jah. Com os anciãos rastas, aprendeu a importância da paz e da comunhão com a natureza. De Bunny Wailer, ex-integrante dos Wailers originais e lenda viva local, recebeu o apelido leonino e a missão de reinventar seu espírito e, por tabela, sua carreira.
Iluminado por esta energia, Snoop recrutou Diplo e Major Lazer para produzirem o trabalho que revelaria o novo homem, pai, marido e artista que ele se tornou. A dupla, especialista em batidões, pega leve e só acelera em “Fruit Loops”, erigida sobre a levada do clássico “Under Me Sleng Teng”, de Wayne Smith, que em 1985 introduziu a era digital na música jamaicana. Nas demais faixas, a brisa e a brasa dominam.



Logo na abertura, a enraizada “Rebel Way” alerta que há muita morte, destruição, ruína e incompreensão na música – males não alheios ao passado gangsta de seu autor. “Smoke The Weed” atualiza o refrão original cunhado por Palma Dog em 1984 para um libelo em prol do mato queimado. Imersa na cultura da ilha, “Boulevard” remete ao rock steady, um dos gêneros que embalava os bailões de Kingston na década de 1960.



Assim que ganhou as ruas, Reincarnated dividiu opiniões. Wailer voltou atrás e o acusou de heresia. A crítica considerou apenas oportunismo – conclusão meio automática depois de ver a velha guarda de fora para dar lugar a participações dos nada ortodoxos Miley Cyrus e Akon. Mais óbvio, no entanto, é perceber que Snoop e reggae foram feitos um para o outro, em uma conexão que demorou para acontecer e, agora concretizada, parece evidente. O resto se dissipa na fumaça.

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