20151117

Raridades nada preciosas

Ninguém discute a importância do Nirvana, o talento de Kurt Cobain, a grande perda que foi seu suicídio. Mas fica difícil convencer disso o moleque que está chegando agora no rock com a trilha sonora do documentário Montage of Heck. Na película, casadas com imagens igualmente caseiras, as canções até tinham alguma função. Em disco, não passam de bobagens – a despeito do valor histórico que possam ter – reunidas com o único intuito de explorar a boa fé dos fãs com a rapa do tacho do ídolo.



O álbum está sendo vendido em duas versões. A convencional traz 13 faixas. A luxuosa amplia o constrangimento para 30. Salvo curiosidades para colecionadores fanáticos, como esboços do que viriam a se tornar Been a Son e Something in the Way, as “músicas” (põe aspas aí) mostram que o coitado do Cobain jamais imaginaria que seus registros em cassete feitos de 1987 até a morte em 1994 acabariam comercializados. Do contrário, supõe-se, não gravaria arrotos, imitações de barulhos de flatos e experiências que beiram o inaudível, de tão grotescas.

Se bem que, desprezando a fama e todo o circo midiático como ele desprezava, é bem capaz que tenha deixado tudo isso pensando no futuro, eternizando seu lado mais auto-indulgente e desagradável na crença de que valeria ouro e não faltariam trouxas para engolir tal empulhação como relíquia. Para os artistas, fica a lição: destruam qualquer coisa que não pretendem lançar, sejam ensaios, brincadeiras ou diálogos captados por um microfone aberto no estúdio. Para ganhar mais dinheiro em seu nome, os herdeiros não hesitarão em lhe expor ao ridículo. E que se dane a posteridade.

Leitura punk
Iggy Pop já fez muita coisa da qual não deve se gabar. De uma, porém, pode se orgulhar: não ter melado o lançamento da biografia Open Up and Bleed, mesmo não ajudando o autor Paul Trynka em nada. O livro já está nas livrarias nacionais, expondo em português todas as maluquices que fizeram do vocalista uma das criaturas mais selvagens da música. Típico representante do white trash dos Estados Unidos, James Osterberg Jr. (seu nome real) passou a infância morando em um trailer com a família em Michigan. Bom aluno, na escola dizia que queria ser presidente do país – e os colegas acreditavam, tamanha era sua desenvoltura. Até descobrir o rock, primeiro com os Stooges e depois solo. Há drogas em quantidades cavalares, sexo desenfreado, shows que terminam em pancadaria e bastidores da produção de discos. Como diz o escritor no prefácio, “como pôde um homem ser tão inteligente e tão estúpido?”.



 L ANÇAMENTOS


Caraudácia – A banda de Florianópolis estreia com um disco homônimo em que leva ao pé da letra o fato de não ter gênero definido. A opção liberta o grupo da camisa-de-força do rock, o que sempre é saudável. No entanto, também impõe um grande desafio: como forjar uma identidade própria investindo em tantos estilos? Ao longo de 10 músicas, aparecem MPB, reggae, funk, tudo meio diluído em meio a tantas direções. Com um pouco mais de foco (ouça Ano pra Ferver), o segundo disco promete.



Jaloo, #1 – Aposta do selo StereoMono (parte do Skol Music), o paraense fez um álbum com pegada pop eletrônica, que conversa com o mundo sem em nenhum momento renegar a origem brasileira. O toque original vem das festas de aparelhagem e do brega, tão comuns em seu Estado. O produtor Carlos Eduardo Miranda – descobridor do Raimundos, entre outros – só teve que dar aquela polida para que músicas como Insight, Odoiá (In Your Eyes) e Ah! Dor revelassem todo o seu potencial.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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