Era para demorar no máximo quatro horas, tempo que a maioria dos cantores levava para gravar duas ou três canções. Mas não João Gilberto, que podia ser tudo, menos um cantor dado a arroubos operísticos, típico da época. Assim como não era convencional o tipo de música que ele se propunha a fazer para embalar sua voz miúda, quase sussurrada: delicada em vez de grandiloquente, cheia de nuances, com uma batida diferente e harmonias que desafiavam o padrão vigente. A Bossa Nova – como ficaria conhecido o estilo idealizado pelo baiano – pedia passagem.
Depois de muitas brigas de João com os instrumentistas que o acompanhavam para que entendessem a sonoridade que ele buscava, finalmente naquela quinta-feira foram registrados os takes definitivos de “Chega de Saudade” e “Bim Bom” no estúdio da Odeon no Rio de Janeiro. O resto é uma história que completa 60 anos neste 10 de julho, transformada em romance por Ruy Castro no livro homônimo ao lado A do compacto.
Embalada pelo primeiro título do Brasil em Copas do Mundo, conquistado 12 dias antes, a Bossa Nova iria se tornar a trilha sonora de um país com um futuro brilhante. Éramos os reis do futebol, a tenista Maria Esther Bueno ganharia o torneio de duplas de Wimbledon, produzíamos carros e a nova capital logo ficaria pronta. Entre esperanças frustradas e promessas não cumpridas, restou o poder emanado a partir de um banquinho e um violão.
Para Santa Catarina, a Bossa Nova tem ainda um significado especial: o maior nome da música do Estado, Luiz Henrique Rosa (1938-1985), começou identificado com o ritmo e nele compôs algumas de suas melhores canções. O disco independente Mestiço, quando já havia se bandeado para outras paragens sônicas, é o único trabalho do catarinense no Spotify, que fez uma compilação sobre o gênero. Mas na plataforma de streaming se acha material para montar a playlist abaixo, mostrando a influência daquela que seja, talvez, a maior contribuição nacional à cultura mundial.
(obs.: “Blue Island”, creditada apenas a Walter Wanderley, originalmente faz parte de Popcorn, disco gravado em conjunto por ambos em 1967.)
(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)
20180710
Nos 60 anos da Bossa Nova, uma playlist para mostrar a influência do gênero
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