20140919

A triste queda dos pássaros formosos

(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

Está na praça um livro que joga luzes sobre uma época tão rica quanto pouco analisada da cultura nacional. Como o título promete, Pavões Misteriosos – 1974-1983: A Explosão da Música Pop no Brasil, do jornalista André Barcinski, cobre o hiato entre a MPB politizada dos anos 1970 e o estouro do rock silvícola na década seguinte. Com o adicional de que, ao tentar explicar por que tantos discos seminais surgiram no país no período em questão, ajuda a entender também como se formou a mentalidade que iria prevalecer no futuro.
O marco inicial é a chegada do Secos & Molhados ao topo das paradas em 1974, desbancando Roberto Carlos. A ascensão do grupo liderado por um Ney Matogrosso andrógino, de cara pintada e quase nu refletia a transformação pela qual passava toda a indústria da música brasileira de então. Gente como Raul Seixas, Tim Maia, Rita Lee e Jorge Ben lançava seus trabalhos mais ousados. Alguns alcançavam o grande público, outros eram incompreendidos; todos conseguiam gravar suas experiências.

O autor mostra que, até 1983, quando Ritchie conquistou o povão com “Menina Veneno”, havia lugar também para falsos gringos cantando em inglês (Mark Davis, na verdade Fábio Jr.), picaretagens armadas por produtores (Gretchen) e pastiches sintonizados com as ondas que vinham de fora (Frenéticas). Daí em diante, por razões que incluem decadência criativa, exigência por resultados e aversão ao risco, ficaria cada vez mais difícil para os pavões continuarem misteriosos. O mercado é louco, mas não rasga dinheiro.

Raiz punk, fruto reggae
O pai integrou uma banda ícone do punk e a filha segue a carreira musical. O que ela faz? Reggae, lógico – afinal, entre outras conexões, a Babilônia combatida por Bob Marley e o “sistema” que os proletários ingleses queriam derrubar eram o mesmo inimigo. Portanto, nada mais natural do que Hollie Cook investir forte no ritmo jamaicano. Em seu segundo disco, Twice, a herdeira de James Cook (ex-baterista dos Sex Pistols) atualiza a levada roots que garante a brisa em “Ari Up”, “Desdemona” e “Postman”.



Enfado mortal
O problema de Strut nem é a música. O funk-rock setentista diluído em pop de Lenny Kravitz continua presente em seu décimo disco. O que complica a situação do cantor é que há cada vez menos bípedes interessados nisso. A crítica nunca o engoliu, a juventude o ignora e as fãs que restaram têm coisas mais importantes para se preocupar do que defendê-lo. Fica a dica: contra o enfado, não há abdômen trincado que dê jeito.

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