20161206

Um trocadilho a serviço da sujeira glam

Farra do Bowie não é só o melhor nome de banda nacional dos últimos tempos. O trocadilho – uma arte representada atualmente na música gringa por gente como Chet Faker, Dandy Warhols, Joy Orbison, Com Truise ou Slick Jagger, mas que nunca foi bem explorada nesta terra de artistas sérios – expressa com exatidão a proposta da camarilha de Florianópolis. Seu disco de estreia Born to Be a Faggot leva o ouvinte para um rolê regado a álcool, tabaco & aditivos químicos na companhia de seres sem sexo definido nem compromisso com a ressaca.



A estética glam, adotada por David Bowie em determinado momento da carreira, aparece de cara na abertura com a faixa-título. Tão cara ao estilo, a androginia é escancarada a partir do verso que a batiza, “nascido para ser uma bicha”. A sonoridade crua e áspera perpassa as nove músicas, empilhando referências do quilate de New York Dolls, Stooges e Rolling Stones da primeira metade dos anos 1970. Principalmente quando se sabe que o guitarrista André Seben, veterano da cena local, paga pau para Keith Richards (quem não?).

“Fap Farmer”, “Raised to Be a Wanker” e “Mental Condition” enquadram-se nessa categoria, enquanto as canções em português sugerem também outras manifestações do submundo. A trinca “Esquizofreak”, “Vidal Claustrofobia” e “Saí para Comprar um Cigarro” conjuga blues de garagem com velocidade que se aproxima do hardcore, como se os Replicantes rastejassem decadentes pelo centro da ilha. Para finalizar, mais um jogo de palavras: “There’s no Time, Toulouse”, com épicos nove minutos de distorção. É a infâmia a serviço do rock.

Funk’n’roll
Quem sobreviver ao show de lançamento do disco da Farra do Bowie nesta quarta (7) deve considerar a hipótese de se acabar no sábado no Babilonya Club sob o sonzeira da Pata de Elefante. Desativado há mais de três anos, o trio gaúcho volta a Florianópolis com a reputação de ser uma das melhores bandas de rock instrumental do país. A abertura fica por conta dos paulistas do Black Papa (já abordados nesta coluna) homenageando Funkadelic e Parliament. Ou seja, o negócio começa com o groove espacial dos grupos de George Clinton e termina com todo mundo esmagado pela potência mastodôntica dos gaudérios. Domingo vai ser pouco para a recuperação. Mais informações aqui.




 ANÇAMENTOS



A Tribe Called Quest, We Got It from Here... Thank You 4 Your Service – Dezoito anos depois, os rappers mais relaxantes da quebrada voltam com o flow intacto em um álbum duplo. Garantia de levadas com tecladinhos jazzy (“Space Program”), samples espertos (“We The People”, com um Sabbath ) e uma irresistível manha em desanuviar o cabeção (todas).



Frank Zappa, Zappatite – Coletânea com as faixas mais saborosas do gênio maluco morto em 1993. Pode funcionar como porta de entrada para se interessar pelo bigodudo, pois serve apenas o lado acessível de uma obra tão gigante quanto irregular. Mas não espere simplicidade: mesmo quando flerta com o pop, Zappa dá um jeito de aloprar.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

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