20170214

SC não reconhece nem os poucos ídolos que poderia ter

Tão pujante em indicadores socioeconômicos, com números “de primeiro mundo” e coisa & tal a embalar delírios separatistas, Santa Catarina é de uma pobreza franciscana quando a comparação com outros Estados resvala para a música. Dá para contar nos dedos das mãos os catarinenses de relevo no cancioneiro nacional, independentemente do estilo – com certeza, você tentou lembrar de algum agora para desmentir o enunciado e teve dificuldade. Um dos poucos nessa lista, Orlandivo morreu no último dia 8 aos 79 anos de enfisema pulmonar sem ser reconhecido pelos seus conterrâneos.



É verdade que o cantor e compositor nascido em Itajaí nunca cultivou maiores vínculos com a terra natal. Toda a sua carreira foi construída no Rio de Janeiro, para onde se mudou ainda criança. Lá, estreou em 1962 com o disco A Chave do Sucesso, batizado em alusão ao objeto que, em suas mãos, virava instrumento de percussão: um molho de chaves. Presente no álbum, o clássico “Onde Anda o Meu Amor” lhe abriu as portas da fama como um dos mestres do sambalanço, mantidas escancaradas no decorrer da década com hits como “Bolinha de Sabão” ou “Tamanco no Samba”.



Após um período esquecido, Orlandivo voltou a sentir o gostinho da popularidade em 1974 como coautor de “Vô Batê pá Tu”, malandragem eternizada pelo grupo Baiano & Os Novos Caetanos. Despediu-se do mercado fonográfico com o CD Sambaflex, em 2006, sem conseguir reviver o restrito estrelato que já havia gozado. De fato, do tamanho de gigantes como Jorge Ben ele nunca foi. Mas, diante da escassez de ídolos nativos para louvar, não seria absurdo Santa Catarina lhe render todas as homenagens pelo menos depois de morto, com direito a luto oficial e bandeira a meio pau. Fica aqui a nossa reverência.



Reggae em traje esporte fino
O reggae sempre bateu ponto na discografia do Thievery Corporation de forma diluída, como um dos componentes da paleta de ritmos usados para revestir a sonoridade elegante de Rob Garza e Eric Hilton. No 10º trabalho, eles radicalizaram. The Temple of I & I é totalmente dedicado ao gênero jamaicano já a partir do título – “I & I” é um termo rastafári que pode ser traduzido por “eu & Jah”. No entanto, não precisa ser iniciado no culto nem usar dreadlocks para sentir os efeitos da proposta. Até porque o disco não mergulha na vertente roots, e sim a transporta para o universo familiar à dupla de Washington, como em “Letter to Editor” e “Let the Chalice Blaze”.




 ANÇAMENTOS


Kiko Dinucci, Cortes Curtos – O guitarrista estreia solo com abordagem tão anticomercial quanto a do grupo do qual faz parte, o seminal Metá Metá. Com referências de metal, rock, hardcore e samba, o disco se desenrola torto, tornando cada faixa um desafio para quem ousar rotulá-las. Como o próprio autor definiu, trata-se de obra para ser ouvida inteira, de uma tacada só, de preferência em alto volume. Disponível para download gratuito no site do artista.



Sleaford Mods, English Taps – Se o seu negócio é música sem firulas, cantada com sotacão inglês, veio ao lugar certo. Com a dupla de Nottinghan não tem papinho de sensibilidade ou sofisticação – vide “B.H.S.”, “Just Like We Do”, “Moptop” ou “Messy Anywhere”, prontas para virar hinos de hooligans.



(coluna publicada hoje no Diário Catarinense)

Nenhum comentário: