20080116

Um ano de livros com hífen no título

Tive saco para anotar, em ordem cronológica, os livros que derrubei durante o ano. É isso que dá ficar lendo não-ficção demais. Deixa que em 2008 eu tiro O Tempo E O Vento da fila e me redimo com o literatura brasileira, com o romance regional, com o Rio Grande do meu pai. Encarar a caudalosa trilogia de Érico Veríssimo é fácil. Difícil será não pensar em Tarcísio Meira quando o Capitão Rodrigo apear do alazão e entrar na venda do Nicolau, viola a tiracolo, como se fosse um velho conhecido em Santa Fé: “Buenas e me espalho! Nos pequenos dou de prancha e nos grandes dou de talho!”. É com esses que eu vou.

Entre os gêneros que compuseram minha bibliografia no último exercício fiscal e literário, de música não houve nada melhor do que Maysa – Só Numa Multidão de Amores (Globo). Lira Neto me transformou em um fã tão ardoroso da mulher que faço questão de preservar uma ignorância preventiva em relação à cantora.

Em ficção estrangeira, um relançamento e uma aquisição que ficou para trás inscreveram seus nomes na memória afetiva. Medo e Delírio em Las Vegas (Conrad), de Hunter Thompson, ressuscitou com uma capa alaranjada, enfeitada pelo traço doentio que Ralph Steadman imprimiu no cartaz do filme. Minha edição anterior era aquela lilás, publicada pela nanica Anima em 1984 e arrematada no começo da década de 1990 em um sebo paulistano com o título original adaptado para Las Vegas na Cabeça. (Anotação mental: ter edições diferentes do mesmo livro é muito mais grave do que do mesmo disco.)

Pois o clássico do mestre gonzo passa na prova do (meu) tempo com a sua maior qualidade intacta. Apesar de todos esses anos, me despedi de Raoul Duke com a cabeça fritando como a dele, totalmente dopado pela vontade de escrever QUALQUER COISA. Passagens não aborvidas em sua plenitude quando detonadas pela primeira vez respondem certas dúvidas existenciais:

“Jornalismo não é uma profissão, não é nem mesmo um ofício. É uma saída barata para vagabundos e desajustados – uma porta falsa que leva à parte dos fundos da vida, um buraquinho imundo e cheio de mijo, fechado com tábuas pelo inspetor de segurança, mas fundo o bastante para comportar um bêbado deitado que fica olhando para a calçada se masturbando como um chimpanzé numa jaula de zoológico.”
Meu Nome É Charlotte Simmons, de Tom Wolfe (Rocco), repousava na pilha dos “próximos” desde 2005 até piscar para mim. Durante dois dias, só larguei suas mais de 600 páginas para passear com o cachorro pelo campus, onde topava com os arquétipos que o autor também encontrou na tradicional universidade Dupont. Lá como cá, a estupidez é o esperanto do comportamento.

Por fim, é imperioso mencionar A Dança dos Deuses, de Hilário Franco Júnior (Companhia das Letras). Futebol e política, futebol e sociedade, futebol e cultura, futebol e religião, futebol destrinchado em fatos que expressam em sentido literal as mais variadas metáforas às quais o esporte está associado. Livraço-aço-aço.

Sem vocês, as cagadas de 2007 teriam demorado menos (em negrito, os que fizeram a perna formigar):

Roberto Carlos em Detalhes
, Paulo César Araújo
Tempestade de Ritmos, Ruy Castro
Tempos Heróicos, Jakzam Kaiser
Maysa – Só Numa Multidão De Amores, Lira Neto
Kind Of Blue – A História da Obra-Prima de Miles Davis, Ashley Kahn
Contracultura através dos Tempos, Ken Goffman e Dan Joy
Almanaque da Música Brega, Antonio Carlos Cabrera
Japop – O Poder da Cultura Pop Japonesa, Cristiane A. Sato
Multidão, Antonio Negri
O Rio Musical de Anacleto de Medeiros, André Diniz
Praticamente Inofensiva, Douglas Adams
O Super-Homem Vai ao Supermercado, Norman Mailer
Dentro da Floresta – Perfis e Outros Escritos da Revista The New Yorker, David Remnick
Eu, Robô, Isaac Asimov
Era uma Vez o Amor mas Tive que Matá-lo, Efraim Medina Reyes
Quem Matou Vargas, Carlos Heitor Cony
O Menino, Edward Bunker
Para Entender Michael Jackson, Margo Jefferson
Ao Som do Mar e à Luz do Céu Profundo, Nelson Motta
Aventura no Caminho dos Tropeiros, Jakzam Kaiser
Histórias de Aprendiz, Werner Zotz
Jantares em Diferentes Países, Jacques Arago
Despachos Do Front, Michael Herr
Hip Hop e a Filosofia, William Irvin (coord.)
Amêndoa, Nedjma
Vida Que Segue – João Saldanha e as Copas de 1966 e 1970
As Melhores Reportagens de Joel Silveira
As Palavras Andantes, Eduardo Galeano
Aventuras de uma Pseudovirgem, Iris Bahr
Madame Satã, Marcelo Leite de Moraes
Um Cadáver ao Sol, Iza Salles
Medo e Delírio em Las Vegas, Hunter Thompson
Mauá – Empresário do Império, Jorge Caldeira
Vidas Secas, Graciliano Ramos
Crônica de uma Morte Anunciada, Gabriel Garcia Márquez
Lembra do Transasom?, Marcelo Ferla e Pedro Sirotsky
A Dança dos Deuses, Hilário Franco Júnior
João Saldanha – Uma Vida em Jogo, André Iki Siqueira
Meu Nome É Charlotte Simmons, Tom Wolfe
Tingo – O Irresistível Almanaque Das Palavras Que A Gente Não Tem, Adam Jacot de Boinod
Jimi Hendrix – A Dramática História De Uma Lenda Do Rock, Sharon Lawrence
Crônicas de um País Bem Grande, Bill Bryson
Sgt. Peppers Lonely Hearts Club Band – Um Ano Na Vida Dos Beatles E Amigos, Clinton Heylin
A Love Supreme – A Criação Do Álbum Clássico de John Coltrane, Ashley Kahn

2 comentários:

Dauro Veras disse...

Bela lista. Preciso ler mais não-ficção.

Felipe Lenhart disse...

Boa! Continue anotando. Só faz bem. Abraço