20220406

Pelo desrespeito aos fatos



É dura a vida de estilista. Não que não tenha assunto, pelo contrário. Tudo vira um amontoado de ruído, uma espiral de bobajada que envergonha até o mais mundano cronista. Graças à divulgação do Tribunal Superior Eleitoral deste ex-país, por exemplo, me liguei que estava rolando o Lollapalooza. Aí fui assistir ao dia do Planet Hemp e fiquei com a nítida sensação de que a plateia não conhecia as músicas da banda.

Como não quero pagar de tiozinho (que sou), não falarei mais nada – e também porque está proibido criticar qualquer artista sem levar em conta uma porrada de questões extramusicais. Só digo que, pelo que foi mostrado na televisão, pelo menos metade das atrações não tem a menor condição nem de subir ao palco da Festa da Laranja. Então é isso, “nunca foi só música”, a ponto de inclusive poder prescindir de ser música se conseguir convencer marcas e seguidores de que é “sobre” alguma coisa.

Troco de canal e sinto o mesmo desconforto com o Oscar, mas como não entendo (também) de cinema me limito a achar o que vejo somente constrangedor e sem graça. Tanto que nem notei a gravidade do tabefe que um homem rico deu em outro homem rico para defender sua esposa rica, a única vítima da patacoada. Somente com a repercussão do gesto que percebi o fuzuê, pensei que tivesse sido encenado.

É muita informação, deixa eu me organizar: um festival em que o engajamento substituiu a curadoria; uma premiação da qual ninguém ia se lembrar se não fosse uma agressão; a habitual sucessão de baixezas, trapalhadas e patifarias perpetradas por e em nome do vencedor da famosa escolha difícil.

Passo. Besteira por besteira, eu crio as minhas sem nenhum compromisso com o factual. Vou ali assar abobrinha no forno (atenção: isso não é uma metáfora) que eu ganho mais.

(Extraído da newsletter Extrato. Assine já e garanta o seu exemplar antecipado todas as terças!)

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