20211027

Aliás e a propósito

(Em 1999, quando a internet ainda era movida a modens, tive o privilégio de criar um site com os queridos Camilo Rocha, já um nome consagrado da imprensa musical, e o então imberbe André Valente, que se tornaria um talentoso quadrinista e ilustrador. Era o The Bambas, que durante o pouco tempo hospedado no jurássico Geocities saiu até na Folha de S. Paulo. A responsável pela proeza foi uma nota intitulada “O caô do Caê”, reproduzida abaixo.)

Desde o início de sua carreira, Caetano Veloso tem servido como aglutinador de artistas e personalidades públicas. Uns dizem que é seu espírito generoso, outros que é apenas uma forma de cooptar forças que possam gerar antagonismo ao que ele instituiu nos anos 1960. Curiosamente, todos os artistas de sucesso que se envolveram com o autor de “Alegria, Alegria” tiveram um destino conturbado. Nem seus colegas tropicalistas escaparam, mas estes só sofreram a maldição após a volta de Veloso de seu período de exílio – caso do poeta paiuense Torquato Neto, que se suicidou (e ficou fora da lista por não ser músico). Mais curioso ainda é que nenhum baiano foi atingido pelo sortilégio:

ARACY DE ALMEIDA
Contribuição histórica: Cantora símbolo da era do rádio no Brasil, era a intérprete favorita de Noel Rosa
Conexão com Caetano: Gravou o samba dele “A Voz do Morto” em 1968 e se declarou sua fã
O que aconteceu: Amargou anos de ostracismo e terminou como jurada do Show de Calouros de Sílvio Santos

BARÃO VERMELHO
Contribuição histórica: Protagonistas da primeira onda do rock nacional nos anos 1980
Conexão com Caetano: Ele os elogiava constantemente e incluiu a música “Todo Amor Que Houver Nessa Vida”, da banda, em seus shows
O que aconteceu: Cazuza deixou o grupo em 1986 e a banda só voltou a vender bem em 1996, após a morte do vocalista original

JARDS MACALÉ
Contribuição histórica: Um dos mais inventivos participantes do tropicalismo, autor da cult “Gothan City”, apresentada no IV Festival Internacioanl da Canção em 1969
Conexão com Caetano: Hospedou o cantor em sua casa em 1964, produziu o LP Transa e fez vários arranjos para ele, Gal e Bethânia
O que aconteceu: Foi dispensado da gravadora em 1974 e pegou a fama de maldito

JOHN LENNON
Contribuição histórica: É pai de Sean Lennon, amigo dos Beastie Boys
Conexão com Caetano: O baiano gravou “Help!”, de autoria do beatle, no LP Qualquer Coisa, de 1977
O que aconteceu: Foi assassinato a tiros três anos depois, na porta do prédio onde morava em Nova York

MUTANTES
Contribuição histórica: Responsáveis pela parcela pop-rock do movimento tropicalista
Conexão com Caetano: Gravaram vários singles e LPs com o cantor e o acompanharam em shows e festivais
O que aconteceu: O trio original se desintegrou em 1973; Arnaldo Baptista despirocou, Rita Lee ficou infeliz e Sérgio Dias virou guitarrista de rock progressivo

ODAIR JOSÉ
Contribuição histórica: Primeiro ídolo brega nacional, “terror das empregadas” e autor de hits como “A Pílula”
Envolvimento com Caetano: Foi chamado por ele para tocar o clássico “Vou Tirar Você Desse Lugar” no festival Phono 73
O que aconteceu: Foi vaiado pelo público “cabeça”; tentou gravar um disco conceitual influenciado por The Who e Peter Frampton e nunca mais fez sucesso

RITCHIE
Contribuição histórica: Autor do maior hit de 1982, “Menina Veneno”, cujas vendas provocaram ciúme até em Roberto Carlos
Envolvimento com Caetano: Gravou “Shi-Moon”, um tecnopop, com ele
O que aconteceu: Viu seu sucesso ir embora e hoje vive de fazer diagramação para home pages

RPM
Contribuição histórica: Fenômeno do circuito das danceterias e ídolos de meninas pré-púberes na década de 1980
Envolvimento com Caetano: O cantor elogiou os ombros de Paulo Ricardo e reclinou sobre eles enquanto cantava “London London” no programa Chico & Caetano
O que aconteceu: O RPM acabou, voltou e não deu certo, acabou de novo, voltou de novo e não deu certo de novo; Paulo Ricardo, coitado, virou um errante

SEPULTURA
Contribuição histórica: Grupo brasileiro com maior repercussão internacional em todos os tempos
Envolvimento com Caetano: Subiu ao palco com ele e Carlinhos Brown na Bahia, em 1996
O que aconteceu: No ano seguinte, Max brigou e saiu da banda, antecedendo meses de baixaria nos jornais

TANTRA
Contribuição histórica: Grupo de apoio da Legião Urbana em turnês monstruosas, assinou contrato para seu primeiro disco com a gigante Universal Music
Envolvimento com Caetano: O baiano participou do clipe da cover que eles fizeram para “Tropicália”
O que aconteceu: A banda foi dispensada da gravadora e sumiu do mapa

(Extraído da newsletter Extrato. Assine já e garanta o seu exemplar antecipado todas as terças!)

Nenhum comentário: